Trump e Temer. É possível ter alguma esperança?
Débora Nunes
Ok, ok, é de temer e é de doer. Esses homens no poder mostram a falência da democracia em garantir a vontade da maioria. Os vícios dos sistemas eleitorais (caso dos EUA em que Hillary teve maioria dos votos) e os procedimentos parlamentares (caso do Brasil, em que Dilma foi destituída de seus 54 milhões de votos) mostram que a democracia precisa ser reinventada. Esses homens no poder mostram também que a deriva direitista do momento político atual é grave e que as formas de fazer política precisam mudar. A desunião crônica dos setores progressistas não pode persistir, pois a união dos que focam tudo no dinheiro e no poder é fácil. Se os desafios que se anunciam são imensos, reinventar a política do nosso lado é o único caminho.
Como falar em esperança quando tudo parece desmoronar? Quando o governo Temer avança contra os ganhos de justiça social e emancipação que vivemos na última década e quando um governo truculento, xenófobo, racista e machista vai ser empossado com Trump daqui a pouco? Só um olhar de longo prazo pode mostrar que a esperança vem, de um lado, do fato que as sociedades no mundo inteiro descreem da política que hoje segue o jogo do dinheiro e da mídia. Do outro lado, é possível ver que iniciativas contra-hegemônicas, que funcionam em outra lógica política, se espalham silenciosamente, com dificuldade, mas mostrando caminhos.
Temer e Trump estão no poder não porque o “povo”, em sua maioria, quis assim. Vejam os índices baixíssimos de aprovação do governo Temer e o fato de que Trump chegou ao poder com uma minoria de votos. Mesmo se as pessoas não conseguem identificar de onde vêm os desvios da democracia - e deixam que o poder vá exatamente na direção dos que manipulam bem o universo do dinheiro e da mídia - elas estão buscando “salvadores” que julgam estar fora do sistema político tradicional. Nesse ponto, de buscar alternativas, nós e os apoiadores de Trump e Temer estamos juntos.
A esperança vem, portanto, carregada de responsabilidade. Nós, milhares no mundo todo, que estamos enfrentando o sistema decididamente, mudando nossas formas de viver por opções mais conscientes, pela renúncia ao consumismo, pela busca de soluções mais coletivas e com liderança compartilhada, pelo enfrentamento cotidiano ao machismo e a todos os preconceitos, que vivemos com ética e acreditamos em valores de partilha, coresponsabilidade e respeito à Natureza, nós somos o caminho. Entendermos-nos como o caminho que inspira e dá esperança e nos apoiarmos mutuamente, tecendo a grande rede que defende a Vida, de formas variadas, exige muito trabalho.
A união dos que são contra-hegemônicos dá trabalho porque estamos sempre muito ocupados em criar opções que são marginais ao sistema – o qual resiste fortemente às nossas ideias e práticas e assim nos exaure, mas também porque temos dificuldades de nos unir. Somos contaminados pela competição, que é a mola mestra do sistema capitalista. Só que nesse campo “eles” são mestres: quando seus interesses se contrapõem, não têm grandes pruridos em se “desfazerem” uns dos outros, pois não são amarrados por princípios éticos que freiam o “lado de cá”. Mas seguem unidos na maior parte do tempo. Nós, não, quase nos “evitamos”, pra não encararmos que estaremos sempre encontrando defeitos nos caminhos que os outros “alternativos” empreendem. Mas quando nos unimos, a história já provou, todo o processo avança.
As iniciativas contra-hegemônicas já são fundadas em princípios que promovem a cooperação, o respeito à Vida e à sua diversidade, só precisamos colocá-los em prática para tecermos a imensa teia da esperança ENTRE NÓS. Certamente o capitalismo não é mais hegemônico nos corações das pessoas, se é que algum dia ele foi. Nossas propostas de vida mais amorosa e cooperativa, de igualdade e respeito aos diferentes são de longe mais apaixonantes e inspiradoras. O desafio de buscar a união dos movimentos, das iniciativas, dos projetos, encantando-nos com a diversidade uns dos outros e desafiando nossos conflitos como forma de crescermos, de evoluirmos como indivíduos e como opção política de cooperação e partilha de poder está diante de nós. Cedo ou tarde, vamos avançar.
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