Segundo dados do
Centro Brasileiro de Estudos
Latino-Americanos, só em 2010 foram assassinadas 36.792 pessoas no
Brasil, uma média de 100 por dia. Armas, narcotráfico e corrupção.
A
reportagem é de
Eric Nepomuceno, publicada no jornal
Página/12, 21-03-2013. A tradução é do
Cepat publicados pelo IHU no dia 22/03/2013.
Entre 2004 e 2007, o conflito armado do
Iraque resultou em 76.266 mortos. No
Sudão, outro país em convulsão, os mortos foram 12.719, um
pouco a mais do que os 12.417 registrados no
Afeganistão. No mesmo período, os mortos da
Colômbia foram 11.833. Contudo, no Brasil, entre 2004 e 2007,
ocorreram 147.343 mortes por armas de fogo. Esse número é ainda mais impactante
quando comparado com o total de vítimas fatais registradas em doze países que
viveram conflitos armados. Da República do Congo ao Paquistão, passando pela
Somália, por territórios palestinos e por
Israel foram 169.574 mortos.
Esses são os dados
reunidos pelo
Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos,
que acabam de ser divulgados em Brasília. Somente em 2010, foram assassinadas
36.792 pessoas no Brasil, uma média de cem por dia ou de quatro por hora. Uma a
cada quinze minutos.
Existem outros aspectos, do mapa da
violência no Brasil, que chama a atenção. Se antes as mortes
violentas estavam concentradas nos dois maiores centros urbanos, São Paulo e Rio
de Janeiro, agora o fenômeno se nacionalizou. Com isso, o Brasil continua
ocupando um lugar de destaque entre os países mais violentos do mundo, tomando
como base a proporção de assassinatos para cada cem mil habitantes: 20,4
pessoas.
Esse número coloca o Brasil em oitavo lugar entre as cem nações
com estatísticas consideradas relativamente confiáveis, segundo a instituição. A
média de assassinatos é o dobro daquela que a
ONU considera
tolerável (dez para cada cem mil habitantes).
Julio Jacobo Waiselfisz, coordenador da
pesquisa, destaca que a violência se disseminou por todo o país, embora tenha se
concentrado no nordeste e no norte.
Em
Alagoas, por
exemplo, em 2010, foi registrada uma taxa de 55,3 homicídios para cada cem mil
habitantes. Trata-se do estado onde mais são
assassinados negros e mulheres. Na capital, Maceió, famosa por
suas praias e polo de atração turística, essa média é de 94,5 para cada cem mil
habitantes. Não apenas é a capital mais violenta do Brasil, mas uma das mais
violentas do mundo.
O problema é que outras capitais muito turísticas,
como
Salvador da Bahia, também aparecem com índices
elevadíssimos (59,6 assassinatos para cada cem mil habitantes). O
Rio de
Janeiro, oitavo estado com maior proporção de mortos por armas de fogo
(26,4 para cada cem mil habitantes), tem uma capital relativamente segura, se
comparada com as demais: 23,54. Mais do dobro do índice determinado pela
ONU.
São Paulo, o mais rico e povoado estado do país, é
um dos quatro, entre os 27 estados brasileiros, que ficam abaixo da marca que a
ONU considera “tolerável”: 9,3 assassinatos para cada cem mil
habitantes. Foi o estado com a mais significativa diminuição dessa proporção, no
período entre 2000 e 2010, com 67,5% menos assassinatos. No
Rio de
Janeiro a queda foi de 43%. E no
Pará, entre 2000 e
2010, o número de assassinatos cresceu o absurdo de 307%. No vizinho
Maranhão, também no norte miserável, aumentou 282,2%. Na Bahia,
195%.
O estudo abrange um período que vai dos dois últimos anos do
segundo mandato presidencial de
Fernando Henrique Cardoso até o final dos
dois mandatos de
Lula da Silva. O resultado demonstra que
apesar dos governos estaduais, ao longo de todos esses anos, declararem
reiteradamente que a segurança pública era tema prioritário (também os governos
nacionais bateram na mesma tecla), os resultados são claros e preocupantes. São
políticas ineficazes ou, no melhor dos casos, insuficientes.
Há muitas
explicações para o fenômeno da violência: o narcotráfico, a grande quantidade de
armas (legais e, principalmente, ilegais) em circulação e a própria cultura da
violência como via para solucionar conflitos pessoais.
Junto a isso é
preciso somar a corrupção policial, a incompetência policial no momento de
investigar os crimes, a absurda morosidade e a corrupção da
Justiça, o estado degradante e degradado do sistema
carcerário.
Em relação à forma como as mortes por armas de fogo se
disseminaram rapidamente por todo o país, deixando de se concentrar nos dois ou
três maiores centros urbanos do Brasil, a explicação é surpreendente. Segundo a
pesquisa realizada pelo
Centro Brasileiro de Estudos
Latino-Americanos, o fenômeno diz respeito à desconcentração industrial
e migração interna provocada pela expansão geográfica de atividades econômicas.
Ou seja, quanto mais a indústria e a economia se desconcentram, mais a violência
segue o mesmo caminho.
A responsabilidade direta da segurança pública é
dos estados, ainda que o governo nacional também tenha sua própria política
sobre o assunto. De qualquer forma, os resultados observados devem ser
atribuídos, principalmente, aos governos estaduais, que se mostram, na maioria
das vezes, incapazes de frear a violência que cresce e se dispersa na medida em
que aumenta e é disseminada a oferta de trabalho.
Isso tudo faz lembrar
um velho ditado brasileiro: “Se correr, o bicho pega; se ficar, o bicho come”.
São assim as coisas. O país diversifica sua economia, em todas as partes crescem
as possibilidades de trabalho, emprego e renda, e também cresce a possibilidade
de que, diante de uma política ineficaz de segurança pública, você seja atingido
por um tiro.