segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

MUDANÇAS CLIMÁTICAS E SOBERANIA ALIMENTAR

Estou disponibilizando o texto que contém notas para o debate numa oficina no Fórum Social Temático, realizado em Porto Alegre. A humanidade está precisando enfrentar com urgência os efeitos da dominação do mercado capitalista sobre a distribuição e sobre o uso dos alimentos: 1 bilhão de pessoas se encontra na miséria, sem ter o mínimo para alimentar-se; outro 1 bilhão alimenta-se de forma insuficiente, com carências, sem segurança nutricional; e outro 1 bilhão sobre por obesidade, isto é: ou come demais e/ou alimenta-se seguindo as receitas absurdas dos Fast Food.


Vale um tempo de reflexão crítica sobre este desafio. E de busca de caminhos para que possamos garantir alimentos saudáveis para todas as pessoas e povos em cooperação com a Terra. Isto exigirá a construção de uma nova civilização.



MUDANÇAS CLIMÁTICAS E SOBERANIA ALIMENTAR[1]
Ivo Poletto[2]
1.  Uma guerra de séculos
A humanidade vive o grau máximo de sua guerra contra a natureza, declarada e executada desde Francis Bacon no século XVI. Ela é vista como um ser resistente, que esconde e não quer entregar seus segredos. Como o ser humano, portador de razão, teria direito de colocar a natureza a seu serviço, cabe-lhe também buscar esses segredos usando todos os meios necessários. Evidentemente, este direito do ser humano vem junto com o direito de livre iniciativa da ideologia liberal, isto é, o direito de apropriar-se tanto dos conhecimentos científicos como da própria natureza explicada e passível de tornar-se meio de produção de bens para consumo humano. E este direito privado avança também sobre a possibilidade de colocar sob uso privado as capacidades humanas, pagando por elas o preço contratado, deixando ao trabalhador empregado a liberdade de reproduzir suas forças com uso livre do salário que lhe é pago.
Esta guerra de séculos apresenta seus frutos nos dias de hoje:
- o controle econômico e financeiro de um reduzido número de oligopólios multinacionais, ocidentais e orientais; estudo revela que são apenas 147 as grandes empresas que controlam o mercado e a especulação mundiais, a maioria delas bancos;[3]
- o uso de todos os meios para manter sob domínio privado as últimas reservas de fontes fósseis de energia, de minérios, de água, de florestas, de biodiversidade;
- o uso extremo da obsolescência programada (diminuição da durabilidade) para manter em expansão o mercado mundial de mercadorias, de modo especial no 1/4 da humanidade que já consome mais de 80% delas, explorando ao máximo o consumo individual, ocupando as cidades com automóveis, multiplicando o desperdício...
- o uso cada vez mais intensivo de produtos químicos para programar os solos em função das sementes, visando aumento quantitativo de commodities agrícolas, cada vez mais contaminadas e contaminadoras;
- entre as batalhas mais recentes, celebra-se a vitória sobre a dependência da agricultura à reprodução natural das sementes, agora programadas em laboratório, não mais genéticas, e sim transgênicas – e já se anuncia e se deseja impor a semente transgênica suicida, que só germina uma vez...
Poderíamos avançar nesta lista de resultados, de festejados ganhos dessa guerra para os proprietários capitalistas. Mas, como se deixou de reconhecer, por ignorância ou, provavelmente, por interesse, que a natureza tem limites, que os bens naturais ambicionados são limitados, e que as leis naturais, uma vez dominadas e domesticadas, poderiam tornar-se fontes de desequilíbrios no ambiente favorável à vida, gerado em milhões de anos pela Terra – e não pelos seres humanos -, precisamos igualmente ter presentes os seguintes efeitos desta guerra:
- o modo de vida baseado no sistema capitalista produtivista e consumista, que exige crescimento constante, já ultrapassou a capacidade da Terra de repor os bens dela retirados para mantê-lo...
- o uso de fontes fósseis de energia em todos os campos da existência, a concentração da população em cidades sem cuidado com os lixos e esgotos, a derrubada de florestas para uso de madeiras e para aumentar áreas de agricultura, pecuária e mineração, o avanço sobre os mares sem cuidado com sua biodiversidade: tudo isso aumentou a emissão de gases de efeito estufa na atmosfera numa velocidade espantosa, especialmente nas últimas cinco décadas;
- este aumento de emissões foi agravado pela derrubada e queima de florestas e pela fragilização e morte de seres vivos marinhos, seres vivos que poderiam absorver parte do dióxido de carbono que aquece o planeta...
- ao lado do desperdício praticado por 20% da humanidade, sofrem e lutam contra a miséria mais de um bilhão de pessoas...
- o aquecimento da temperatura da Terra provoca o agravamento de fenômenos naturais, na forma de eventos climáticos extremos, aumento de precipitações intensas de chuvas, enchentes destruidoras, desmoronamentos, vendavais, ciclones, derretimento de neves e gelos, nos pólos e nas cordilheiras, elevação do nível das águas dos mares, cobrindo ilhas e partes dos continentes...
- estudos recentes comprovam que o número de pessoas que migram e não podem retornar aos seus lugares de origem por causa de desastres socioambientais é cada vez maior e já supera o dos que migram por causa de conflitos políticos...[4]

2. A guerra contra a fome
É preciso deixar clara a diferença entre a guerra pela expansão do mercado capitalista e a guerra contra a fome. O que interessa ao capital, mesmo quando declara que deseja combater a fome, é que aumente o consumo, até mesmo de dinheiro, aprofundando a especulação e a dominação através da dívida, e isso pode ser realizado com a existência, até mesmo em quantidade crescente, de pessoas sem acesso aos bens básicos de alimentação. A forma em que se enfrentou a recente crise financeira de 2008, e insiste-se em enfrentá-la no seu segundo round, em 2011, levou mais 250 milhões de pessoas à miséria.
Por isso, a guerra capitalista contra a fome serviu, na realidade, de justificativa mundial para promover e justificar a denominada revolução verde, e mais recentemente, o uso de sementes transgênicas. O que se produziu com ela foi a apropriação privada de territórios extensos, o crescimento da produção laboratorial e industrial de produtos químicos e a dependência da agricultura ao seu consumo em quantidades cada vez maiores, o uso intensivo de água e de energia para irrigação, o crescimento do domínio dos grandes e oligopolizados laboratórios, a concentração do comércio de grãos em poucas empresas transnacionais, o uso de commodities agrícolas para especulação financeira...
Em outras palavras, a miséria atual pode e deve ser compreendida como resultado desse tipo de sistema capitalista mundializado de crescimento econômico, uma vez que se sabe que já se tem capacidade e se produz mais do que o suficiente para alimentar toda a humanidade. Perre Sané, da UNESCO, afirmou que a miséria só será derrotada quando for abolida, da mesma forma que o foi a escravidão moderna, funcional a uma das fases do capitalismo. Definida em lei como crime contra o direito à vida e contra a dignidade humana, quem a provoca poderá ser responsabilizado judicialmente por seu crime.[5]
Por isso tudo, a guerra dos povos contra a fome e a miséria, isto é, a luta atual pelo direito humano universal à alimentação e nutrição, é uma luta que se dá em diversos campos, mas todos têm em comum a denúncia, o combate e a superação do sistema capitalista. Destacam-se as opções entre:
a)      Agronegócio X produção agroecológica
b)      Monocultivos extensos X produção familiar camponesa e em territórios coletivos de povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais
c)      Semente natural, valorizando o que há de alimentos nos diferentes biomas e ecossistemas X semente transgênica em todo o planeta
d)     Economia com as florestas e biodiversidade, conservando as que existem e recriando-as X apropriação privada de todos os solos e bens naturais
e)      Direito humano à soberania alimentar e nutricional X submissão ao mercado mundial de alimentos
f)       Agricultura que emite óxido nitroso e metano, gases de efeito estufa X agroecologia, que ajuda a Terra a recuperar o equilíbrio climático, com médias de temperatura favoráveis a todas as formas de vida...

3. Outra civilização, com soberania alimentar

Por mais importante que seja para os milhões que se encontravam ou que continuam em situação de miséria, programas de governo como o Bolsa Família – principal programa social do atual Brasil sem Miséria, que substitui o Fome Zero – não são suficientes. Por não serem Políticas de Estado, sua continuidade ou seu enfraquecimento ou abandono depende das opções do governo de plantão. Por isso, junto com constitucionalização do direito universal à alimentação e nutrição, conquistada pela sociedade civil brasileira, é necessária uma política de Estado que defina metas e recursos para que a miséria venha a ser realmente derrotada.
Seguindo no exemplo do Brasil, a manutenção do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC - como o motor do desenvolvimento do país indica que a superação da miséria, se ocorrer, se dará não pela vitória da soberania alimentar, mas como integração dependente e limitada de mais pessoas ao mercado capitalista. Por mais que haja limitada redistribuição de recursos da classe média para os mais empobrecidos, o que realmente cresce é o capital financeiro e algumas empresas que se tornam multinacionais com apoio de recursos públicos, via BNDS. Trata-se de um capitalismo que continua periférico, dependente da exportação de commodities agrícolas e minerais e da entrada de capitais especulativos, atraídos pela política de altas taxas de juro. Isso agrava a dívida pública, que serve como mecanismo de dominação privada capitalista sobre o Estado e de privatização capitalista dos recursos públicos.
A busca da soberania alimentar implica, hoje, enfrentar e superar a forma capitalista de domínio e abuso dos bens naturais, a dependência do uso de fontes fósseis de energia, o domínio do mercado globalizado... Em sentido inverso, significa reconquistar o reconhecimento de que cada povo tem direito de viver e alimentar-se em seu território, com o que a Terra criou e ofertou ao ser humano em cada bioma e ecossistema, com seus hábitos alimentares, com suas sementes, com sua cultura...
Caminhar nesta direção significa superar todo o sistema de dependência química e industrial do modelo de produção do agronegócio, pois ele serve apenas para agredir, envenenar e desertificar os solos, para produzir alimentos envenenados e para enriquecer um número cada vez menor de proprietários. Em sentido inverso, significa reconhecer as potencialidades e promover as várias formas de agroecologia, aprofundando o conhecimento e a prática de tecnologias que recuperem a vitalidade dos solos, a qualidade alimentar das sementes nativas, que restabeleçam a convivência entre diferentes plantas, insetos e animais, colaborando com a Terra em seu esforço de recuperar seu equilíbrio atmosférico...
Mesmo assim, serão indispensáveis mudanças profundas na civilização do produtivismo e consumismo, sem o que não haverá como produzir alimentos verdadeiros e saudáveis para todas as pessoas. É um absurdo tanto afirmar que se deve aceitar a atual proposta de Código Florestal para aumentar a produção de alimentos com a tecnologia do agronegócio, como afirmar que, até 2050, será preciso aumentar a produção em 70% por meio de ganhos de produtividade do atual modelo dominante de agropecuária: no primeiro exemplo, concedida anistia de crimes ambientais, quererão mais e mais, até não haver espaço para que a Terra se mantenha com córregos, rios, espaços de reprodução de seres vivos dos rios e dos mares, e tudo isso para produzir mercadorias envenenadas para as indústrias de alimentos; no segundo, ampliada a direção imposta pelos laboratórios e empresas de produtos químicos, o ganho de produtividade se dará com o aumento do uso de sementes artificiais e dos insumos químicos, propagando novas formas de doenças, envenenado e contaminando solo, subsolo e atmosfera...
Para concluir, e parafraseando Mahatma Gandhi: se todas as pessoas buscarem com simplicidade os alimentos necessários, evitando desperdícios, há condições de produzir o suficiente para todas as pessoas; mas para alimentar pessoas e povos gananciosos, nunca se produzirá o suficiente, haverá famintos e a Terra será mais agredida. Sem uma mudança civilizacional, em que se renovem as relações entre os seres humanos e deles com a Terra, mãe de todas as formas de vida que conhecemos, como proposto e praticado pelos povos milenares do Bem Viver, não se alcançará segurança e soberania alimentar e nutricional para e com todas as pessoas.






[1] Notas para debate na Oficina sobre Mudanças Climáticas e Soberania Alimentar, organizada por Secour Catholique, no Fórum Social Temático, dia 27 de janeiro de 2012.
[2] Assessor do Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social e da Cáritas Brasileira e pastorais sociais da CNBB.
[3] Ver Matemáticos revelam rede capitalista que domina o mundo, na revista New Scientist, 22/10/2011, reproduzida pelo sítio Inovação Tecnológica.
[4] Ver Os novos refugiados, em IHU terça, 24/01/2012.
[5] Pierre Sané, “Pobreza, a próxima fronteira na luta pelos direitos humanos”, in Jorge Werthein e Marlova J. Noleto. Pobreza e Desigualdade no Brasil. Brasília: UNESCO, 2003, p.27.

PRÊMIO DA VALE: PIOR EMPRESA DO MUNDO!

A mobilização popular, usando diferentes meios, funciona, sim: foi ela que definiu a VALE como a pior empresa do mundo.

Vejam, por isso, o vídeo de agradecimento a todos que participaram. E vejam como ONGs como o PACS, do Rio de Janeiro, estão envolvidas, junto com movimentos sociais, na continuidade do desmascaramento da tal "economia verde", um verde que só aparece e aumenta na quantidade crescente de dólares resultantes da depredação de bens naturais e da exploração e marginalização de seres humanos e de povos.


Amigxs,
 
Esta é uma vitória político-midiática de muita importância para a luta dxs trabalhadorxs da Vale e de toda a gente afetada pelas atividades social e ambientalmente perversas desta empresa. Obrigado pela sua participação! Recomendo que vejam o youtube de 1min40 de duração!
O PACS, junto com outras entidades, está preparando o Relatório de Insustentabilidade da Vale, para lançar em abril de 2012, no mesmo dia do lançamento pela Vale do seu Relatório de Sustentabilidade. Vamos também apresentar estas evidências nas Conferências da Rio+20, insistindo que a “Economia Verde” proclamada por empresas, governos e ONU como a solução para as Mudanças Climáticas, é como dar mais veneno para curar o envenenado, pois ela significa a mercantilização e a financeirização de tudo que na Natureza ainda não virou mercadoria.
Também estamos colaborando na preparação de mais um Encontro Internacional de Afetados pela Vale.
A mineração é uma das atividades mais predatórias para a Natureza. Ainda mais quando é voltada para a exportação pura e simples da matéria prima, sem qualquer beneficiamento que valorize a riqueza do subsolo brasileiro.
Vamos dizer NÃO à política de exportação desenfreada das nossas matérias-primas, inclusive o petróleo, que configura o modelo agro-mineral-exportador que o Brasil tem optado por manter desde os tempos coloniais.
OUTRO DESENVOLVIMENTO É POSSÍVEL, NECESSÁRIO E URGENTE!
 
Abraços, a luta continua!
Marcos
 
From: pe. Dário
Sent: Saturday, January 28, 2012 10:05 AM
 

Mensagem a todos que votaram na Vale como pior do mundo


As entidades promotoras da candidatura da Vale como pior multinacional do mundo (Public Eye Award) enviam a todos os que votaram uma mensagem sobre o significado da 'vitória' dessa multinacional. Veja aqui o vídeo-mensagem.

domingo, 29 de janeiro de 2012

CASAS PRODUTORAS DE ENERGIA ELÉTRICA SOLAR

Li hoje em jornais que finalmente os responsáveis pela política pública de energia estão finalizando proposta que legalizará a produção de energia elétrica solar nas residências dos brasileiros. Seguindo o que já é feito há mais tempo na Alemanha e em outros países europeus, serão instalados medidores que registrarão quanta energia é jogada na rede pública e quanta é gasta na residência. No final do mês, ou há um desconto em relação ao consumo, ou haverá um crédito para gastos futuros.

É uma boa notícia. Agora, só falta tornar-se definição real. E, a partir daí, que ela seja comunicada em todo o país e as famílias sejam estimuladas a entrar nessa de produzir parte ou toda a energia consumida de forma descentralizada, começando a acolher a abundante energia solar presenteada pela Terra em todas as regiões do país.

Por outro lado, será preciso baratear o preço dos componentes. Para isso, a melhor estratégia não será favorecer a produção em território nacional por empresas de outros países. Certamente, o reconhecimento de pesquisas e tecnologias desenvolvidas no Brasil, como é o caso da célula fotovoltaica desenvolvida pelo departamento de Física da Pontifícia Universidade Católica de Porto Alegre, já patenteada e testada para a industrialização, é o caminho para a produção com preços mais acessíveis e livre de royalties. É desejável, por isso, que o governo disponibilize recursos públicos em favor da industrialização desta e de outras tecnologias brasileiras.

Amiga e amigo, informe-se sobre isso e faça tudo que estiver ao seu alcance para que esta decisão se torne de fato uma política inovadora em nossa política de produção de energia elétrica.

FÓRUM SOCIAL TEMÁTICO E A CÚPULA DOS POVOS

Como o Fórum Social Temático - FST - foi anunciado e realizado como preparação para a Cúpula dos Povos na Rio+20, a metodologia seguida nele não deixa de preocupar. Quem e como se fará a sistematização do que houve de crítica ao capitalismo existente e de propostas para avançar na construção do outro outro mundo possível e urgentemente necessário? Além disso, a Cúpula dos Povos seguirá a metodologia do FST, valorizando atividades autogestionárias, que podem manter isoladas as iniciativas e propostas dos movimentos e entidades?

No FST, por exemplo, houve em torno de 900 atividades, mas como cada participante tomará conhecimento do trabalho dos outros? A riqueza da diversidade pode não se fazer presente nas unidades em processo, necessárias para enfrentar o poder agressivo do capitalismo dominante e para garantir a qualidade do processo de construção da nova civilização, em que todos e todas estão empenhados.

Creio que há necessidade de dialogar sobre a metodologia a ser seguida na Cúpula dos Povos. Uma das ideias já em circulação indica a necessidade de se dedicar as tardes a assembleias. Pela manhã, atividades autogestionárias; à tarde, esforço de sistematização, destacando uma ou mais dimensões do novo mundo em construção a cada dia. Para isso, mais do que palestras, as assembleias poderiam começar com a apresentação do que já se produziu de críticas e propostas em espaços preparatórios, como FST. Em seguida, colher as contribuições dos trabalhos da manhãs. Por fim, mesmo ficando claro que se trata sempre de pontos de chegada que são, ao mesmo tempo, pontos de partida, encaminhar a aprovação conjunta das sistematizações.

Estas propostas aprovadas tornam-se, ao mesmo tempo, expressão de compromissos dos e para os movimentos e entidades participantes e de propostas a serem enviadas aos negociadores oficiais da Rio+20.

Com isso, movimentos e entidades clareiam suas perspectivas comuns, que darão maior unidade às manifestações públicas e às lutas e trabalhos futuros. E o acolhimento ou não por parte dos governantes presentes na Rio+20 reforçara e legitimará as ações dos 99% da humanidade indignada com o que está acontecendo com a Mãe Terra e com seus filhos e filhas.

sábado, 14 de janeiro de 2012

20 HORAS DE TRABALHO POR SEMANA. É POSSÍVEL?

Lendo reflexões sobre a crise que não tem fim na Europa, uma me chamou a atenção: a que propunha a redução do tempo de trabalho para 20 horas por semana. Seria uma estratégia eficaz tanto para criar oportunidades de trabalho, especialmente para os jovens, como para redistribuir a renda, cada dia mais concentrada.

Como você, também perguntei-me se isso seria possível. Porque, evidentemente, o pressuposto é manter e até mesmo aumentar os salários recebidos por 34, 36 ou 40 horas semanais. Num primeiro momento, parece algo impossível, e a razão está no fato de termos engolido o essencial da sociedade denominada de livre mercado: o caráter sagrado da propriedade privada de qualquer bem, de qualquer tipo, mesmo quando ela delega poder de vida ou morte para a humanidade a poucas centenas de proprietários. É o que está mantendo e aprofundando a crise européia, que é, na verdade, crise mundial: os detentores da propriedade do capital financeiro, mesmo sendo, em sua maior parte, pura especulação, estão sendo defendidos em seu direito de propriedade pelos políticos que administram os recursos públicos. O caráter sagrado dessa defesa se manifesta na frieza com que os políticos repassam aos bancos mais e mais recursos que deveriam ser destinados à garantia dos direitos das pessoas, direitos que têm a ver com a vida.

Por isso, para perceber a possibilidade da estratégia de 20 horas semanais é preciso dessacralizar a visão da propriedade privada capitalista. Em outras palavras, só a redistribuição dos recursos atualmente concentrados em tão poucas propriedades torna possível esta mudança histórica. Na verdade, o que aconteceu é que os ganhos de produtividade alcançados com o uso de novas tecnologias favoreceram unicamente os proprietários; os trabalhadores, ou foram demitidos, ou tiveram o trabalho desvalorizado. Já é tempo, e é mais do que justo e necessário, que estes ganhos revertam em maior qualidade de vida para toda a humanidade, e uma das condições dessa maior qualidade é que todos dediquem menos tempo ao trabalho e disponham, por isso, de mais tempo livre.

Vale a pena destacar como esta mudança modificaria o humor das pessoas. Primeiro porque todas se sentiriam valorizadas em suas capacidades de trabalho; depois, porque todas participariam dos frutos da produção coletiva de bens e serviços, superando a insegurança em relação ao futuro. E pode-se imaginar como seria menos violenta a vida em sociedade, tornando possível canalizar recursos para outras dimensões da vida, de modo especial ao cultivo da beleza dos ambientes, da arte, do lazer. As pessoas poderiam dedicar mais tempo ao cultivo pessoal, crescendo em dimensões como o prazer das amizades, o amor aos familiares, a participação na vida política, avançando na construção de sociedades realmente democráticas.

Faça sua escolha e, se julgar positiva esta proposta de redução das horas de trabalho, lute por ela.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

GOVERNO FEDERAL FAZ BELO MONTE CONTRA TUDO E TODOS

Vejam, amigas e amigos, a notícia do que está acontecendo na região em que o governo decidiu construir a hidrelétrica Belo Monte. Por que tanta teimosia e má vontade em relação a outras fontes de energia, como a solar, mais do que abundante e gratuita, e a eólica? Há cegueira ou comprometimento consciente com os grupos econômicos interessados em obras que agravam a destruição do meio ambiente da vida?


É preciso aprofundar esse debate e torná-lo acessível a todas as pessoas, pois só assim haverá condições de que decisões como esta sejam tomadas por meio de democracia real, acionando o único soberano neste tipo de sociedade: o conjunto dos cidadãos e cidadãs. 


IHU - Quarta, 11 de janeiro de 2012
Belo Monte: Brasil desqualifica ação da OEA e projeto original é posto em dúvida
O governo federal decidiu que 2012 será o ano da usina hidrelétrica de Belo Monte, cuja construção iniciou em junho de 2011. No terceiro dia do novo ano, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) formalizou a última desapropriação de terras para construção da usina no estado do Pará. Ainda no final de 2011, um conjunto de ações em âmbito internacional alicerçou a concretização daquela que será a terceira maior hidrelétrica do mundo. Primeiro, o governo brasileiro não compareceu, em outubro do ano passado, à audiência sobre medidas cautelares que determinam a suspensão da obra de Belo Monte na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) da Organização dos Estados Americanos (OEA). Depois, o ex-ministro Paulo Vanucchi retirou sua candidatura a membro da CIDH, resultando na ausência de integrantes brasileiros na Comissão em 2012. E, para desqualificar ainda mais o sistema interamericano de direitos humanos, o Brasil suspendeu a contribuição orçamentária anual do Brasil à OEA, que era de US$ 6,2 milhões.
A reportagem é de Rachel Duarte e publicada pelo jornal eletrônico Sul21, 10-01-2012.

A última ata oficial da CIDH aponta a modificação da medida cautelar referente à usina de Belo Monte, alegando que “o debate entre as partes, no que se refere à consulta prévia e ao consentimento informado em relação ao projeto Belo Monte, transformou-se numa discussão sobre o mérito do assunto que transcende o âmbito do procedimento de medidas cautelares”.

Diante de tudo isso, a professora de Direito Internacional do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo,
Deisy Ventura, considera pouco provável que a CIDH envie a demanda de Belo Monte para a Côrte da OEA. “Houve uma pressão muito forte do Brasil e a Comissão voltou atrás”, conclui. A professora também salienta que o Brasil já foi destinatário de diversas medidas cautelares da Comissão Interamericana e até condenado em quatro demandas junto à Corte da OEA e jamais havia reagido da maneira que reagiu no caso de Belo Monte. “Teve o caso Ximenes Lopes, em 2006, sobre violações dos direitos de um doente mental; o Caso Garibaldi e o Caso Escher, ambos em 2009, sobre violações de direitos relacionadas a conflitos de terra. E, ao contrário do que houve agora, o Brasil sempre procurou cumprir as recomendações e decisões do sistema interamericano de direitos humanos. Como explicar esta atitude? Toda potência econômica estaria condenada a menosprezar os sistemas de controle das normas internacionais de direitos humanos?”, critica. E complementa: “O Brasil perdeu uma boa oportunidade de fazer a diferença”.

“Governo faz manobras”

Se até mesmo o sistema interamericano de direitos humanos cedeu à pressão do governo federal, internamente não há neutralidade sobre a construção da usina de Belo Monte.
 Ibama, Incra e outros que deveriam zelar pelo meio ambiente e pela limitação da terra estão favorecendo a realização da principal obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

“O Ibama diz que vem fiscalizar todo o mês a obra. O projeto é do governo federal e eles também. Como um órgão federal fiscaliza outro que age sob o mesmo interesse? Até o judiciário assina embaixo do que o governo está fazendo. Um juiz disse que os direitos do povo de Altamira eram ideologia do Ministério Público”, relata a coordenadora do Movimento Xingu Vivo para Sempre,
 Antonia Melo.

Apesar das reivindicações do
 Movimento Xingu Vivo Para Sempre e do Movimento Gota D´Água ainda no final do ano passado, o governo federal segue sem prestar esclarecimentos à parte mais afetada com as obras. Em resposta ao último abaixo-assinado entregue aos ministros Edison Lobão (Minas e Energia), Izabela Teixeira (Meio Ambiente) e Gilberto Carvalho em dezembro de 2011, a União lançou um decreto para a nova desapropriação em janeiro deste ano. “Nós estamos muito indignados. Isto é abuso de poder. Não pode se tratar de um projeto sério se as coisas são feitas assim. Na reunião, nos pediram para não fazer da principal obra do governo um fato negativo, mas, nem a promessa de discutir as licenças ambientais está sendo concretizada. O governo faz manobras”, acusa Antonia Melo.

O decreto da
 Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) prevê desapropriar áreas de três cidades, numa área equivalente à metade do Distrito Federal. Ambientalistas criticam o tamanho da zona afetada, alegando alteração do projeto original e cobram maior transparência por parte da União. Pela resolução da Aneel, os 282 mil hectares são de “utilidade pública”. O consórcio de empresas que toca a obra da usina, chamado Norte Energia, está autorizado a remover ribeirinhos, índios e pequenos agricultores que vivem na região. Pode fazê-lo de forma amigável ou por via judicial. E invocar caráter de urgência.

Segundo
 Antonia Melo, a área é bem maior que o plano original e alterará a vida de até 10 mil pessoas a mais. Além disso, ela diz que as novas desapropriações aconteceram de modo arbitrário, da mesma forma como a maioria das intervenções que envolvem a construção de Belo Monte teriam ocorrido. “Dizem que já negociaram com 350 famílias, mas não sabemos se é verdade. Não temos ideia de como serão feitas as desapropriações desta nova área. São quase 300 mil hectares de área. Quantas famílias estão lá? Está tudo obscuro. Só sabemos que do jeito que estão fazendo é uma monstruosidade. Ninguém sabia de nada. Não houve nenhuma conversa prévia com as entidades ou com o Ministério Público. Pegaram uma caneta e confiscaram estes hectares dos três municípios entorno de Belo Monte”, relata.

“A Norte Energia é avessa ao diálogo”

O procurador da República no Pará,
 Ubiratan Cazetta, é um dos que acompanham o caso no Ministério Público Federal. Ele confirma que a Norte Energia “é avessa ao diálogo e só vem para mesa de negociação quando forçada”. Segundo ele, ao fim do recesso judiciário será aberta uma análise do decreto expropriatório da Aneel para comparação das áreas. A Norte Energiaserá chamada para informar como será feita a desapropriação. “Trata-se de uma área tão grande que não há um levantamento de quem será atingido. Isso deveria ter sido feito antes. Há tempos que cobramos essa previsão. A realocação das pessoas é um processo delicado, trata-se de ribeirinhos, pessoas que nunca viveram em áreas urbanas”, explica.

De acordo com o procurador, muitas famílias não possuem propriedade formal e sem o título de propriedade ficarão à mercê da indenização que o governo pretender dar. “Nossa preocupação são os critérios para a desapropriação coincidirem com o estudo de impacto ambiental apresentado. Estamos duvidando do decreto. Parece tratar-se de uma área maior que a anunciada. Se isso se confirmar, já teremos a primeira irregularidade da obra”, avalia.

Com o avanço das obras, iniciadas em junho de 2011, a luta dos movimentos sociais é tentar reduzir os danos da intervenção do estado na terra das comunidades ribeirinhas e indígenas. “Vamos acompanhar a situação das famílias que serão expulsas de seus locais. Até agora não temos uma sinalização da política sobre o encaminhamento destas famílias. A solução não pode ser uma favelização em Altamira ou a criação de tensões entre as famílias ribeirinhas”, diz o procurador
 Ubiratan Cazetta.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

O QUE ACONTECERÁ EM 2012?

Há pelo menos duas interpretações da denominada profecia maia, e eu desejo que aconteça a segunda. A primeira a interpreta como um fim de mundo materializado, produzido por desastres terríveis. A segunda centra a mudança em algo mais profundo: será um ano de transformação no modo de ser humano na Terra.

Se alguém pensar que a segunda interpretação se refere a algo mais fácil, está muito enganado. Trata-se do fim de um mundo, isto é, do fim de uma civilização assentada sobre um autodefinido direito que os homens teriam de submeter a Terra, com todos os seus seres vivos e elementos naturais, ao seu domínio e uso. Esta civilização está levando a Terra ao estresse e desequilíbrio, e a humanidade a uma dominação de poucos sobre quase todos - de 1% sobre 99%, repetem os indignados em cada vez mais numerosas praças do mundo. Por isso, o fim desse tipo de mundo é tarefa que só pode ser realizada por ações de muitos, e ações que abandonam a violência, pois ela tem sido característica dos que foram impondo a civilização dominante. Em outras palavras, ou será fruto da prática real e transparente da democracia, ou não acontecerá.

Os movimentos dos indignados, com suas práticas de ocupar espaços, de exigir democracia real já, de colocar em questão toda forma institucionalizada de política e de economia, carregam em seu seio muito mais mensagens e propostas do que se possa imaginar. São ainda frágeis, limitados, com muitas indefinições. Mas são um começo de movimentos que não esperam realizar mudanças depois de terem derrotado algum inimigo, de terem alcançado um poder de impor mudanças. São movimentos que praticam a decisão coletiva democraticamente, e sobre todos os assuntos que dizem respeito à vida. Isso faz deles, potencialmente, um tipo de ação política que transforma as pessoas ao dizerem não ao que é negativo para a maioria e ao buscarem juntos novas formas de conviver como humanos num ambiente vital criado pela Terra.

Deixo estas notas como indicação do que nos deverá ocupar em 2012, se quisermos que ele seja o fim desse tipo de mundo que ameaça a vida da Terra, de seus filhos e filhas, junto com todos os demais seres vivos. Ou para que seja, pelo menos, um real começo deste fim do mundo da dominação capitalista.

Se desejar, socialize seu pensamento e suas expetativas sobre 2012. Esse espaço de reflexão crítica e cidadania se assume como mais uma frente dos indignados...