terça-feira, 31 de maio de 2011

BRASIL: CORONELISMO RECICLADO PELA CÂMARA FEDERAL?


Na mesma semana em que os deputados federais aprovaram criminosas mudanças no Código Florestal, aconteceram quatro assassinatos na Amazônia brasileira. Seria mera coincidência? Ou existem relações entre esses acontecimentos, aparentemente diferentes?

São tão interligados que muito provavelmente os maiores interessados no avanço sobre a floresta amazônica presentes na Câmara Federal podem ter tido um momento de raiva contra os executores dos assassinatos; afinal, isso poderia colocar em risco a vitória dos que desejavam mudar o Código Florestal. Em outras palavras, lideranças podem continuar sendo executadas, mas não convinha que isso coincidisse com a votação do tema no parlamento.

Na verdade, tudo que aconteceu em Brasília no dia 24 de maio foi marcado pelo cinismo característico das elites que se sabem acima do bem e do mal, seguras de contar com total impunidade. Algumas figuras mais afoitas revelaram que esta característica continua atual ao vaiarem o anúncio do assassinato do casal Maria do Espírito Santo da Silva e José Claudio Ribeiro da Silva, líderes do Projeto Agroextrativista Praialta-Piranheira, no sudeste do Pará. Afinal, agroextrativistas teriam o direito de ter sua morte violenta anunciada na Câmara Federal? Teriam, na verdade, alguma utilidade e mesmo o direito de existir?

A vaia revelou toda a relação entre a mudança do Código Florestal e o “direito” das elites latifundiárias, precedidas ou não por grileiros profissionais, que agem com assassinos profissionais, de eliminar as pessoas que se colocam em seu caminho de apropriação de cada vez maior quantidade de terra. E revela a certeza de que nada acontecerá com eles, visto contarem com um judiciário e com serviços advocatícios que sabem trabalhar com as leis para legitimar o ilegítimo, legalizar o ilegal, inocentar o criminoso; e que sabem jogar sobre os assassinados a culpa por sua própria morte, porque, ao fim e a cabo, teriam agido de forma criminosa ao afrontar os que têm sempre o direito de avançar sobre novas terras! Não adianta apresentarem direitos evidentemente constitucionais, pois nada detém a única real cláusula pétrea da Constituição, segundo os grandes proprietários e seus representantes no Congresso: a intocabilidade da propriedade privada e de seu crescimento através da livre iniciativa dos que têm poder econômico. Este é, na prática, o único direito, e tem fundamento sagrado; a vida, os direitos sociais e outras afirmações constitucionais não passam, para estes senhores do Brasil, de concessões que não podem vingar, a não ser quando servem aos interesses das elites proprietárias.

Para concluir, se com o atual Código Florestal as elites agiram com violência contra todas as formas de vida, imaginemos, se for possível, o que farão com o seu “novo” código florestas. Na mesma semana, e no mesmo dia, elas próprias legislaram em causa própria ao aprovarem mudanças no atual Código Florestal: descriminalizaram suas ações ilegais; liberaram-se do pagamento das multas e dívidas; proibiram os rios de serem rios e as nascentes de jorrarem água; justificaram e liberaram as erosões e deslizamentos de encostas; deram-se o luxo de compensar muito longe e onde custar menos suas agressões ao ambiente vital... Finalmente, sacrificaram o que resta de possibilidade de equilíbrio natural ao seu deus: a propriedade e a riqueza sem fim.

Presto homenagem aos quatro assassinados - Maria do Espírito Santo da Silva e José Claudio Ribeiro da Silva, Erenilton Pereira dos Santos e Adelino Ramos  - e ofereço sua vida como prece ao Deus dos oprimidos e a Pachamama, na esperança de que, com sua proteção sobre o povo e sua ação direta, as elites tenham o que merecem como prêmio por sua violência, ganância, prepotência, usurpação de direitos sociais e ambientais, negação da democracia.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

O PREÇO DE EX-PRESIDENTES E EX-MINISTROS

A notícia do crescimento dos bens do ministro Paloci leva a uma reflexão mais aprofundada sobre a relação entre o serviço público e a iniciativa privada. O próprio Paloci, em sua justificativa, segundo o que foi noticiado, afirmou que o "valor das consultorias de um ex-ministro à inciativa privada é muito alto". É fato também o que foi referido por ele em relação a servidores públicos, inclusive alguns que aparentemente fracassaram em suas iniciativas, que se tornaram diretores, consultores ou qualquer coisa em bancos e grandes empresas em troca de remuneração quase esquisita.

Qual a razão disso? Não se pode dizer que estas pessoas se tornaram especialistas a partir de seu trabalho em instituições estatais. Afinal, segundo o noticiado, também o ex-presidente Lula anda recebendo em torno de R$ 200.000,00 por palestra de menos de uma hora; pelo que se sabe, Lula não fez nenhum curso de especialização. Partindo desta informação sobre Lula, a quanto chegarão seus ganhos em um ano? Em quanto tempo terá ele poder de compra de bens de igual preço dos referidos como propriedade de Paloci? Para chegar aos oito milhões referidos, basta que eles profira 40 palestras. Com três palestras por mês, em um ano ele chegará a 36...

Qual é o tema real do debate?  É, sem a menor dúvida, a relação entre público e privado, dentro e fora das instituições do Estado. Sabe-se que o Estado, segundo a Constituição vi gente, deve zelar pelo bem público, pelo bem de todos os cidadãos e cidadãs do país. Sabe-se, igualmente, que muito recurso público é repassado a empresas privadas para a realização de obras e serviços. Sabe-se que, por isso tudo, as empresas pagam muito bem por serviços de lobistas, com o objetivo de ganhar a preferência na seleção dos que se candidatam a realizar essas obras e serviços. Por fim, sabe-se, e chega quase a ser considerado algo normal, que as empresas, e especialmente as maiores, tentam os servidores do Estado com propinas, tornando-se a parte ativa do que se conhece como corrupção.

Todo alto funcionário que deseja preservar seu nome evita aceitar o que é oferecido. Por outro lado, não poderia aceitar alguma propina ou boa remuneração futura, quando já não será funcionário público, para, em vista delas, favorecer determinada empresa ou grupo econômico?

Em todo este debate, o que aflora é o interesse dos grandes grupos econômicos de avançar sobre os recursos públicos de forma permanente: ganhando as licitações através de lobistas e/ou das propinas, ou tornando-se detentoras de informações privilegiadas. É isso mesmo: informações exclusivas, especialmente sobre os rumos da política econômica, são armas essenciais no jogo da concorrência, e são pagas regiamente.

É nesse contexto que deve ser analisado o "alto valor das consultorias" de ex-altos funcionários de governos: como o preço por esses serviços está muito acima do "mercado", que tipo de informações estão pagando os bancos e grandes empresas? Ou a que tipo de "favores" passados estão pagando?

As questões aqui levantadas não são julgamento concreto de ninguém; são apenas parte de um esforço sociológico para compreender o que se passa nas relações entre o que deveria ser público e o que é interesse privado em sociedades capitalistas, regidas pela denominada livre iniciativa, cada vez mais dominadas, contudo, por corporações com poder real que faz inveja a muitos países. E para deixar claro aos que desejam a existência de sociedades realmente democratizadas que só há um caminho para controlar e modificar essas relações: o crescimento da consciência e da prática da cidadania. Só um povo decidido a não desistir de seu caminho rumo ao autogoverno, submetendo as instituições estatais e a própria economia ao seu controle, será capaz de evitar a privatização do que é bem e serviço público, e de evitar igualmente a estatização das perdas e quebras das empresas privadas.

Algo nesta perspectiva aconteceu e continua em andamento na Islândia, um país que foi retirado dos noticiários da mídia mundial por ser considerado um "mau exemplo" para o enfrentamento das crises provocadas pelo capital financeiro no planeta. Este é, contudo, assunto para outro momento de reflexão crítica.

terça-feira, 17 de maio de 2011

ALEMANHA VEM GERAR ENERGIA SOLAR NO BRASIL?

Para nossa vergonha, uma vez mais são alemães os que vêm promover a produção de energia elétria solar, interessados, sem dúvida, na exportação de sua tecnologias, incluindo o Brasil no mercado mundial da energia limpa. (Vejam texto

Por que, meu Deus, não conseguimos ser inteligentes e levar nosso governo a fazer o mesmo que eles: promover nossas tecnologias, fabricar aqui os componentes, com preços menores, usando nossa matéria-prima, usando de forma inteligente nosso BNDS?

Não se diga que não temos tecnologias, por favor. A PUCRRS está só dependendo de recuros e garantia de mercado para industrializar tanto as células fotovoltaicas quanto os painéis para produção de energia solar, pois a teconolgia já está patenteada, já passou por testes pré-industriais, que comprovaram produtividade e qualidade. A UNICAM já registrou tecnologia para produção do inversor, necessário para transformar a energia solar, que começa como corrente contínua, em corrente alternada e trifásica, para uso generalizado. E deve haver outras tecnologias por aí, desconhecidas pelo governo por causa de sua submissão aos grupos que controlam a mercadoria hidroeletricidade...

Se a energia solar for promovida de forma descentralizada, em cada casa, em cada comunidade, jogando na rede nacional o que não for consumido pelas pequenas usinas caseiras, certamente o preço tenderá a cair e a Terra agradecerá. Mas, para isso, será preciso mudar a política energética nacional.

Abraços.
Ivo 


17/5/2011

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Alemães vão investir em energia solar no país
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Amanheceu nublado, ontem, no Rio de Janeiro. "Promover um encontro assim em um dia de chuva como hoje não parece uma boa ideia, mas na Alemanha funcionou", disseKarim ould Chih no workshop de energia solar promovido pela agência de cooperação alemã (GIZ) e pelo banco de desenvolvimento KfW. Parou de brincar na sequência. Adiantou que o governo alemão está disposto a emprestar no mínimo € 40 milhões, que podem chegar a € 90 milhões, para projetos de energia solar no Brasil.
A reportagem é de Daniela Chiaretti e publicada pelo jornal Valor, 17-05-2011.
O foco é a Copa do Mundo de futebol de 2014, com estádios e aeroportos solares, mas não só. Chih não dá detalhes da operação, mas compara com linhas similares que têm 12 anos de prazo para pagar (incluindo três de carência) e "juros interessantes". OBanco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) atuará junto ao KfW.
"Ainda não fechamos o programa para a Copa Solar 2014", ressaltou. "Mas pretendemos atingir todas as cidades da Copa e ir além disso." Chih é o gerente principal de projetos da divisão de infraestrutura econômica e setor financeiro para América Latina e Caribe do KfW, uma espécie de BNDES alemão. O banco está financiando ou planeja financiar estudos de viabilidade dos estádios solares doMineirão (em Belo Horizonte), Fortaleza, Manaus e Brasília, com recursos a fundo perdido. A Alemanha é reconhecida pela dianteira na tecnologia solar e o mercado brasileiro, praticamente inexplorado, é muito atraente. KfW e BNDES estão juntos, adiantou, para que uma indústria de energia solar se estabeleça no Brasil.
"O Brasil tem a oportunidade de colocar energia solar em todos os estádios da Copa", disse Ricardo Rühter, diretor-técnico do Instituto Ideal, criado em 2007, emFlorianópolis, com o objetivo de promover energias limpas no Brasil e na América Latina. O projeto "Minas Solar 2014", da Cemig, é uma das vitrines do setor para dar mais visibilidade à tecnologia.
Alexandre Heringer Lisboa, da Cemig, conta a experiência do estádio do Mineirão, que deve colocar painéis solares no teto. Depois, a intenção é vender a energia ao consórcio de empresas que irá gerir o estádio.
O mercado brasileiro de energia solar é incipiente, produzindo talvez 2 MW anuais em projetos-pilotos. Uma das estratégias para estimular o setor seria criar uma demanda estável para os projetos de energia fotovoltaica e assim atrair fornecedores internacionais. Outra, ter prazos compatíveis com a vida útil dos equipamentos para pagar linhas de crédito disponíveis, disse Antonio Carlos Tovar, chefe do departamento de energias alternativas do BNDES. Já existe uma diferença no spread de financiamento de energias sujas e de opções mais limpas. O spread básico para projetos de hidrelétricas é 0,9 ponto percentual com 16 a 20 anos de prazo de amortização, enquanto para térmicas de carvão e óleo é 1,8 ponto percentual e o prazo cai para 14 anos.
A iniciativa com os estádios solares extrapola os eleitos para sediar jogos da Copa. O estádio do Pituaçu, em Salvador, não sediará jogos da Copa, mas deve instalar 400 Kw em energia solar.

DESCENTRALIZAÇÃO - UMA POLÍTICA NECESSÁRIA

Acabo de receber uma notícia dando conta que continua muito alto o desperdício de alimentos no mundo: entre 30 e 40%. Há muitos motivos, mas eu quero destacar um deles: a predominância de políticas de concentração no armazenamento, industrialização e comercialização de alimentos.

De fato, se examinarmos a realidade, veremos que diminui o número e aumenta o tamanho das empresas que controlam a alimentação no planeta. Isso se deve ao domínio da livre iniciativa capitalista, nas últimas décadas  marcada pela perspectiva da globalização neoliberal. E se deve à submissão das políticas públicas aos interesses desses grupos econômicos em todo o mundo. Tudo somado, cada país foi estimulado - e até forçado pelo FMI e pelo Banco Mundial - a só produzir o que fosse vantajoso no mercado mundializado, entregando sua produção às empresas, passando a importar tudo o mais, produzido com vantagens comparativas por outros países.

Vale destacar dois efeitos desse tipo de política: diminuição grave de soberania alimentar em muitos países, agravando sua dívida para importar o que deixaram de produzir; aumento estrondoso de meios de transporte, agravando o aquecimento do planeta com o aumento crescente de emissão de gases de efeito estufa na atmosfera.

Quem deseja enfrentar esta problemática, que implica perda de grandes quantidades de alimentos produzidos, geração de miséria e fome e agravamento das mudanças climáticas, deverá combater a política dominante, favorável e quase dependente da concentração em grandes empresas e da transformação de tudo em mercadoria com preço globalizado, imposto pelas empresas proprietárias.

E precisará ser favorável à construção de alternativas. O caminho a ser reconstruído é o da descentralização: produção de alimentos - e de outros bens - o mais próximo possível das pessoas, comunidades e cidades que deles necessitam. Com isso, recupera-se ou avança-se na direção da soberania alimentar de cada país, de cada povo, realizada em cada território, em cada bioma, com a diversidade característica da Terra e das culturas humanas. Com isso, melhorará a qualidade dos alimentos, o desperdício será menor, e diminuirá signitivamente a necessidade de transporte, diminuindo a contaminação da atmosfera com gases de efeito estufa.

Em outras palavras, ou a humanidade se liberta da dominação capitalista, com sua tendência centralizadora e padronizadora, e caminha para outras relações econômicas, descentralizadoras e democratizadoras, ou o aquecimento global agravará o que já é problemático por causa do desperdício de alimentos: ele desestabilizará a própria produção de alimentos na Terra.

terça-feira, 10 de maio de 2011

ASSASSINATO PELA DEMOCRACIA?

Tudo continua muito estranho no decantado assassinato de Osama Bin Laden. A falta de informações justifica o direito da dúvida; até mesmo em relação à sua morte. Afinal, quem tem um mínimo conhecimento da realidade sabe que a CIA não merece confiança como fonte de informação; pelo contrário, a mentira faz parte de suas artimanhas. Por isso, é melhor deixar para outra hora maiores considerações sobre as circunstâncias de sua morte. Por enquanto, é melhor restringir-se ao uso da informação sobre seu assassinato.

De fato, esse acontecimento está servindo como uma luva para as pretensões do presidente Obama: apresenta-o como o presidente que conseguiu caçar o pior terrorista da história. E com isso, conseguirá, com grande probabilidade, reeleger-se presidente dos Estados Unidos da América. Então, o anúncio desse assassinato podia acontecer em momento mais propício? É legítimo especular: não se sabia há mais tempo o paradeiro do "inimigo número um" e se esperou surpreendê-lo quando sua morte serviria melhor aos objetivos políticos de quem está no poder?

Vale, contudo, ter presente dois pontos de reflexão crítica: o assassinato de uma pessoa, por mais que seja terrorista, é caminho que leva para um aprofundamento real de democracia? E quando esta pessoa assassinada é criatura do executor, o que se deve pensar dele?

A democracia não pode firmar-se apenas nas leis, na imposição do respeito a ela: ela depende, para tornar-se caminho humano de convivência, que avance a confiança e a participação livre de todos os cidadãos e cidadãs nas decisões que dizem respeito aos direitos de todas as pessoas e da Terra. Por isso, um país que se apresenta como modelo de democracia deve, ao mesmo tempo, avançar no respeito às leis e na participação livre e confiante de seus cidadãos e cidadãs no governo de suas vidas.

Pois bem, o que fez a CIA e o presidente Obama? Segundo a notícia veiculada - que, por enquanto, é a versão estadunidense do fato -, a execução, via assassinato, e o enterro, via sumiço do corpo no mar, foi decisão pessoal do presidente. Nasce daí a dúvida: se havia a possibilidade da prisão - mesmo se através de discutível invasão num país soberano -, a democracia não avançaria com mais qualidade se ele fosse submetido a julgamento, respondendo por seus crimes e cumprindo sua condenação? A prática do assassinato, mesmo quando autorizado por um presidente dos Estados Unidos, não passa de um crime contra a vida de uma pessoa, e não é prática que favorece a confiança na justiça e a participação consciente da cidadania no governo de suas vidas; pelo contrário, favorece a alienação política, já tão profunda na sociedade estadunidense.

Mas há um fato que torna tudo isso muito mais complexo: Bim Laden é criatura da CIA, ou foi por ela promovido e utilizado enquanto seria aos seus objetivos. Por isso, pode-se pensar que a execução e o desaparecimento no mar tiveram como objetivo evitar que Bin Laden abrisse o jogo, destampando coisas que a CIA e o governo estadunidense não querem que se tornem públicas. Nasce daí o direito à pergunta: execuções de tipo mafioso, silenciando quem sabe demais sobre as formas de agir de determinado governo no mundo, não revelam que a democracia não passa de fachada para práticas de dominação imperial? A CIA não deveria ir ao banco dos réus junto com Bin Laden? Na falta dele, agora, por ação de seu criador, não se deveria encontrar uma forma de cobrar suas responsabilidades?

segunda-feira, 9 de maio de 2011

BIN LADEN: QUANDO A RELAÇÃO COM USA FOI JUSTA?

Mais uma vez a população mundial se vê diante de um dilema: confiar nos USA como fonte de informação, ou manter-se na dúvida em relação à morte de Osama Bin Laden?

Fala-se muito que a humanidade vive na era da comunicação. Mas, em que consiste a comunicação? As empresas privadas que investem nesse tipo de mercadoria entendem que comunicação é o que elas passam aos ouvintes, telespectadores, cibernautas, em troca de publicidade e/ou de mensalidades. Como saber, contudo, se a informação corresponde à verdade? Como não se tem meios para verificar, o jeito é deixar-se levar pelo que é apresentado ou manter-se na dúvida. Um dos direitos universais ligados à comunicação é o de haver fonte declarada, ou seja, possibilidade de verificar se a notícia merece credibilidade. Em outras palavras, cada vez mais o sistema de comunicação depende da confiança em relação às fontes.

Como os USA negam-se a apresentar evidências da morte de Bin Laden, cabe a pergunta: o governo estadunidense merece confiança? Ou melhor, seu sistema de inteligência, a CIA, merece confiança? Como se sabe pela história que a mentira, a criação de intrigas, a geração de instabilidade política, são mediações utilizadas para alcançar os objetivos de poder estadunidense, a resposta à pergunta só pode ser essa: confia neles só quem aceita e defende seus objetivos cegamente. Para os demais, justifica-se o direito da dúvida.

De toda forma, tendo fundamento, a notícia deu conta de um assassinato. De uma pessoa que havia assumido o terror como estratégia, mas que, como pessoa, mantinha o direito de optar entre entregar-se e submeter-se a um julgamento ou de reagir com armas e tornar-se vítima de um enfrentamento. Pelo que foi dito, ele estava desarmado e podia, por isso, ser preso, especialmente pelos soldados ultra profissionais destacados para a tarefa. Tudo indica que eles agiram com uma só ordem: matar. E, em seguida, dar sumisso ao corpo, jogando-o no mar. Por isso, quem aceita a informação sabe unicamente que houve um assassinato.

Assassinato de quem? Do Bin Laden que se transformou no inimigo número um dos USA. O correto é dizer que se transformou ou que foi transformado? É difícil saber, mas parece que a segunda perspectiva é a mais provável. Afinal, não se pode esquecer que a relação da família Bin Laden com comerciantes estadunidenses, como por exemplo a família Bush, é muito antiga, e que Osama entrou na guerra contra a presença da União Soviética no Afeganistão através da CIA, patrocinado por ela; aliás, foi com apoio da CIA que firmou-se o Taleban, uma organização que, como Bin Ladem, revolta-se contra os USA num segundo momento e é redefinida como terrorista.

Terrorista contra a União Soviética é coisa aceitável, desejável, promovida, e quando é contra os USA é crime contra a humanidade? Para quem é contra qualquer tipo de presença e dominação imperial, a reflexão crítica começa pela clara definição da agressão imperial como uma forma de terrorismo. Por outro lado, se um grupo e uma pessoa foram treinados e incentivados a agirem como terroristas contra um império e, uma vez derrotado, sentem-se no direito de continuar agindo como terroristas contra o outro império, que os havia treinado e apoiado, alguma coisa deve ter provocado a decisão. Seria porque se trata de pessoas e povos essencialmente maus? Ou se deram conta que não havia diferenças significativas entre os dois impérios? Ou pior, deram-se conta que o segundo império cobrava ainda maior submissão e entrega de todas as riquezas naturais do país?

Por isso tudo, cabe a pergunta: quando, em que fase da história, os USA foram justos com Bin Laden: quando o usaram como uma das armas para liberar o Afganistão da dominação soviética para submetê-lo à sua própria dominação, ou agora, quando o executam como seu inimigo número um? Penso que seria melhor não falar em justiça; no máximo, houve vingança em relação a um aliado que mudou de posição, sem conceder-lhe o direito de julgamento, em que poderia tentar justificar sua opção. O assassinato e o desaparecimento do corpo não teria a ver com o medo de que toda essa história viesse a tona?

O mundo, mais do que nunca, anseia por paz, por convivência entre povos soberanos, entre culturas diferentes, entre religiões diferentes. E precisa disso para enfrentar os desequilíbrios causados à Terra, que podem levá-la a dispensar a presença humana em seu ambiente vital em pouco tempo. Mas todos sabem que o caminho para alcançar este objetivo não é o terrorismo, feito por a ou por b, por ações de dominação imperial ou como resposta a elas. Nesse sentido, está mais do que na hora de a humanidade exigir dos USA que respeitem a consciência humana e deixem de agir como império, também na hora de comunicar-se sobre a morte de um ex-aliado como Bin Laden.

DESERTO EM MINAS GERAIS DENTRO DE 20 ANOS

Estou em débito com os amigos e amigas que acompanham este espaço. Peço desculpas. Retomo reproduzindo uma notícia terrível publicada pela Folha de São Paulo no dia de hoje, passando pra todos a pergunta que me fiz ao lê-la: o que precisamos para convencer-nos da necessidade de mudanças urgentes em nosso modo de relacionar com a Terra? E quando nossos governos se convencerão de que não adiantará nada fazer leis e programas enquanto continuarem com as prioridades atuais, que agridem o ambiente da vida?


Norte de MG pode virar deserto em 20 anos
Desmatamento, agropecuária e mudanças climáticas deixarão um terço do Estado com suas terras improdutivas
Segundo o governo de MG, é preciso R$ 1,3 bi para frear o processo; governo federal investe R$ 6 mi em todo o país
RAPHAEL VELEDA
DE BELO HORIZONTE
Um terço do território de Minas Gerais pode virar "deserto" em 20 anos. A conclusão é de um estudo encomendado pelo Ministério do Meio Ambiente ao governo mineiro e concluído em março.
O desmatamento, a monocultura e a pecuária intensiva, somados a condições climáticas adversas, empobreceram o solo de 142 municípios do Estado.
Se nada for feito para reverter o processo, de acordo com o estudo, essas terras não terão mais uso econômico ou social, o que vai afetar 20% da população mineira.
Isso obrigaria 2,2 milhões de pessoas a deixar a região norte do Estado e os vales do Mucuri e do Jequitinhonha. "A terra perde os nutrientes e fica estéril, não serve para a agricultura nem consegue sustentar a vegetação nativa", afirma Rubio de Andrade, presidente do Instituto de Desenvolvimento do Norte e Nordeste de Minas, responsável pelo estudo.
A região engloba cerrado, caatinga e mata atlântica. Segundo o governo do Estado, é preciso investir R$ 1,3 bilhão nas próximas décadas para frear o processo, que já causa danos no semiárido mineiro. Lá estão 88 das 142 cidades consideradas suscetíveis à desertificação.
Vladia Oliveira, professora do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará, disse que áreas desertificadas são diferentes de desertos naturais porque passam por um acentuado declínio de biodiversidade até se tornarem estéreis. "Já os desertos são ecossistemas com sustentabilidade, ainda que com baixa diversidade. Eles estão vivos."
PROGRAMA NACIONAL 
O estudo foi encomendado para o Programa de Ação Nacional de Combate à Desertificação, que terá R$ 6 milhões neste ano para combater a desertificação no país.
Andrade diz que, para reduzir o fenômeno, é preciso aumentar as reservas naturais de vegetação e recuperar os recursos hídricos. O agricultor Geraldo Moreno, 50, dono de três hectares em Espinosa (700 km de BH), já sente as mudanças em sua pequena lavoura de feijão. "Se der para [alimentar] a família dá para comemorar", diz ele, que sustenta mulher e quatro filhos com a terra.
"Aqui não chove quase nada e não tenho dinheiro para adubar a terra. O que salva são as cabras, mas estão magras", diz o mineiro, que recebe verba do Bolsa Família para complementar a renda.
O governo pretende reduzir o espaço destinado ao gado nas áreas de caatinga e restringir atividades prejudiciais ao meio ambiente, como a extração de carvão. "A população tem de se conscientizar de que, se essas ações não forem tomadas, nada mais poderá ser produzido", diz Andrade.
(FSP 09/05/11)