PT CADÊ VOCÊ
Pe. Alfredo J Gonçalves, cs
Lembra, caro Bio, o final dos anos 1970 e início da
década de 80? Lembra o entusiasmo, o voluntariado e a teimosia de levantar do
chão um novo partido? Evidentemente, não “mais um” entre os que já disputavam os espaços da então débil democracia
brasileira. Tampouco queríamos “mais um” punhado de políticos no Congresso,
pisando os calcanhares uns dos ouros. A ideia, lembra, era de um partido que
representasse efetivamente os trabalhadores e trabalhadoras, suas famílias; um
canal para onde pudessem convergir os sonhos, aspirações e lutas de base... Um
partido que se erguesse do solo como uma espiga, uma flor ou um edifício! Aliás,
caro Bio, ainda estávamos cruzando a dura travessia da ditadura para o regime
democrático, lembra?!...
Lembra, caro Bio, como a partir dos movimentos e das
pastorais sociais, das entidades e organizações de base nos deslocávamos,
naturalmente, para os pequenos núcleos do PT, ainda incipientes (me vem vontade
de dizer “ainda virgens”)?! E que baita esperança pulsava em nossos corações –
meu Deus! – que ideias iluminavam nossas mentes, que horizontes se abriam ao
nosso espírito sedento de liberdade e de ação?!... Naquelas tardes de domingo,
lembra, o presente parecia conter já todo futuro, de um só fôlego, tal como a
semente contém a árvore inteira! Caminhávamos de um lado para o outro com os
olhos, as mãos e os pés inquietos e irrequietos por mudanças... E os slogans:
trabalho, justiça, liberdade, ética na política, o bem político acima do
interesse pessoal, lembra Bio?!...
E alguns anos mais tarde, caro Bio, veio a abertura “lenta,
gradual e irrestrita”, as eleições à prefeitura, o Movimento “Diretas já” para a
presidência... Lembra com que energia e com que vigor nos lançamos às campanhas
eleitorais. Lembra do “Lula lá!...”, do “Sem medo de ser feliz!...”, da “Esperança
que vence o medo!...”. E tudo isso sem ganhar um tostão, apenas pela vontade de
colaborar para os destinos do país! Bons tempos, não caro Bio?! Sem saudosismos
piegas, sem pretender um retorno impossível ao “paraíso perdido” e sem
sentimentalismos lacrimosos – a verdade é que carregávamos nas veias, no sangue
e nas entranhas a certeza de que podíamos, sim, transformar a sociedade com
nossos ideais e com nossas próprias mãos. Não era isso mesmo, Bio?!...
E por fim, caro Bio, depois de tanto “bater em ferro
quente”, depois dos embates e combates com os dois Fernandos (Collor e FHC),
não é que o povo brasileiro elegeu um representante da “Senzala” e o fez subir
à “Casa Grande” e sentar no trono presidencial?! Porém, caro Bio, naquele passo
memorável, penso que nossas expectativas estavam muito acima de nossa
capacidade de organização, de levar o povo às ruas, de mudar a partir de baixo,
das raízes socioeconômicas e culturais. E o mais grave, caro Bio – mas quem sou
eu para julgar? – parece que nosso homem da “Senzala” se acomodou muito
rapidamente às regalias e privilégios do poder. E juntamente com ele, um
punhado de “companheiros e companheiras” que, sorrateira ou abertamente, de
noite ou à plena luz do dia, foram ocupando os espaços da nova casa, que,
convenhamos, era realmente “Grande”!
Hoje, não sei você, caro Bio, mas para mim como é triste,
melancólico, relembrar tudo isso a
partir do que se passa na Câmara dos Deputados e no Senado, no Congresso
Nacional, nos Ministérios, no Palácio do Planalto, na Capital Federal – para não
mexer no lamaçal da Petrobrás! E isso vem de anos, décadas, séculos! Como é
desencantador ver que até o PT, que trazia no DNA original certa moral do bem
comum, acabou por converter-se naquele “mais um” que tanto temíamos! Não sei
você, caro Bio, mas eu confesso que uma série de interrogações, inquietudes,
dúvidas e suspeitas sobre “a ética na política” rugem furiosamente do lado de
fora de minha janela – como um vento que não quer calar, uma tempestade que não
dá trégua, um rumor ensurdecedor!... E olha, caro Bio, que quase me esqueço de
usar a palavra corrupção!
Roma, 12 de fevereiro de 2015
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