quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

CRISE DA ÁGUA EM SP: MANIFESTO DO COLETIVO DE LUTA PELA ÁGUA

A IRRESPONSABILIDADE DOS GOVERNANTES E DAS EMPRESAS QUE EXPLORAM O SERVIÇO DA ÁGUA BEIRAM O ABSURDO. E AGORA, AMEAÇAM A VIDA DA POPULAÇÃO.

POR ISSO, UNIR FORÇAS DA SOCIEDADE CIVIL É PRÁTICA URGENTE, DANDO PASSOS NA DIREÇÃO DA MOBILIZAÇÃO DOS INDIGNADOS PARA EXIGIR MUDANÇAS POLÍTICAS E GARANTIA DO DIREITO HUMANO À ÁGUA. ELA NÃO PODE CONTINUAR SENDO TRATADA COMO UMA MERCADORIA QUALQUER.

MANIFESTO DE CRIAÇÃO DO COLETIVO DE LUTA PELA ÁGUA

A Água é um Direito Humano, não uma mercadoria!

São Paulo vive uma crise de abastecimento de água sem precedentes. É um momento difícil para todos. Há anos o Governo do Estado vem sendo alertado do risco de um colapso devido de infraestrutura insuficiente para atender a população das Regiões Metropolitanas de São Paulo (RMSP) e de Campinas. Não houve investimento necessário para ampliação dos sistemas de abastecimento que acompanhasse o crescimento das cidades. Descaso com a preservação ambiental, falta de tratamento de esgotos, ocupação das várzeas e intensa impermeabilização do solo somados à insuficiência dos investimentos e à ausência de planejamento, contribuíram para o agravamento da crise.

O modelo de gestão privada agravou-se a partir do momento em que a Sabesp passou a negociar suas ações nas bolsas de valores de São Paulo e Nova York. A busca do lucro a qualquer preço em detrimento da priorização da prestação de um serviço público de qualidade fez com a empresa ignorasse as previsões climáticas que já apontavam para uma redução das chuvas, o crescimento da demanda e negligenciasse todas as advertências, sobretudo a obrigatoriedade estabelecida na outorga do Cantareira de redução da dependência desse Sistema e de redução de perdas por vazamentos.

Como se não bastasse, no momento decisivo em que era preciso medidas eficazes de combate à crise e informação clara de medidas individuais e coletivas, o Governo do Estado esvaziou os espaços de participação e deliberação, como os comitês de bacia hidrográficas , o Conselho Estadual de Recursos Hídricos o Conselho de Desenvolvimento da RMSP e aparelhou. Além disso aparelhou a Agência Estadual de Regulação - Arsesp.

Para tirar o foco da crise, o Governo do Estado, ao mesmo tempo em que pedia para economizar, água dizia que não faltaria água, passando “sinal trocado” para a população. Também demorou a iniciar uma campanha de redução de consumo porque os interesses comerciais de maximizar receita com a venda de água se sobrepõem à necessidade de conscientização da população. E quando o fez, responsabilizou o povo pelo problema, alegando consumo exagerado, ocupação desordenada de áreas de mananciais e furto de água. Transformou, assim, a vitima em culpada.

Só o Governo do Estado não admite ate hoje que os problemas estruturais da crise hídrica são resultados da inoperância da SABESP em investir na melhoria do sistema de distribuição de água que hoje contabiliza cerca de 37% de perda. Também mantém a postura ao continuar superexplorando os mananciais e de estimular o alto consumo de setores industriais, competindo comercialmente com outras soluções para abastecimento de água para os processos de produção.

A situação realmente é alarmante e imprevisível para a população, e a economia do Estado. Há ameaça de desemprego em grande escala em vários setores, escolas terão seu funcionamento afetado, prejudicando a educação de milhares de crianças e adolescentes. A saúde também poderá ser atingida. No horizonte, conflitos pela água.

Uma face perversa da condução dessa crise é privilegiar os usuários mais endinheirados que certamente ampliarão a sua capacidade de reservar água. O contrário acontecerá com a população mais pobre. Na periferia mais distante e nos lugares mais altos, seus moradores já chegam a ficar sem água por muitos dias seguidos.

A política do Governo do Estado está inviabilizando um direito humano fundamental: o acesso à água de forma segura em quantidade suficiente e qualidade comprovada.

O COLETIVO DE LUTA PELA ÁGUA

Com o objetivo de ampliar e unificar ações para pressionar o Governo do Estado a adotar medidas que ao menos, minimizem os impactos da crise, entidades ligadas aos movimentos popular, sindical, gestores municipais e organizações não governamentais, criaram o Coletivo de Luta Pela Água. Juntos defendem o direito a água e ao saneamento como um direito humano fundamental nos moldes da resolução aprovada pela Organização das Nações Unidas (ONU) no ano de 2010. Outra meta do coletivo é constituir os comitês de luta locais como forma de envolver as populações afetadas.

As entidades entendem ser necessário que o Governo do Estado aja com total transparência e mobilize seus órgãos como Cetesb, Secretaria do Meio Ambiente, Defesa Civil, Secretaria da Saúde e Educação para atuar de forma conjunta e garanta a participação da sociedade e prefeituras em todo o processo de debate para enfrentamento da crise.

É preciso que o governo apresente imediatamente um Plano de Emergência que explicite de forma clara os próximos passos que serão tomados a partir de um amplo diálogo com a sociedade e representantes dos municípios.

Acreditamos que para a superação dessa crise seja necessário que o Governo do Estado decrete imediatamente Estado de Calamidade Pública nas Bacias do Alto Tietê e do Piracicaba, Capivari e Jundiaí para enfrentamento da crise e mitigação dos prejuízos aos cidadãos e às atividades econômicas. O Plano deverá contemplar as seguintes medidas:
a) Priorizar o uso da água para consumo humano e de animais;
b) Garantir volume de água suficiente e de qualidade segura para o consumo imprescindível à sobrevivência;
c) Manter sem interrupção o abastecimento dos imóveis em que residam populações internadas, vulneráveis ou serviços públicos de administração pública ou privada, como hospitais, unidades de saúde, clínicas, albergues, asilos, creches, escolas, presídios, delegacias, aeroportos, rodoviárias;
d) Informar locais e horários em que haverá desabastecimento de água ou redução de pressão e prazo de restabelecimento;
e) Administrar com equidade a falta de água, quer seja por racionamento, redução de pressão ou gestão de demanda. É para não penalizar a população que mora nos extremos das periferias e nos pontos mais altos nem privilegiar os endinheirados que dispõe de mais volume domiciliar de reservação;
f) Veicular campanha com esclarecimentos sobre a crise e orientações para proteção da saúde humana contra doenças de veiculação hídrica; g) Iniciar imediatamente a distribuição de caixas de água para todos os imóveis de população de baixa renda que não as disponham;
h) Criar incentivos fiscais para equipamentos hidráulicos que economizam água e, ao mesmo tempo, sua aquisição através de campanhas publicitárias;
i) Estimular a implantação de programas de apoio para utilização de água de reuso inclusive domestico, garantindo apoio técnico e financeiro;
j) Criar sala de situação para todos os sistemas produtores que atendem a RMSP para acompanhamento e divulgação diária das condições de armazenamento dos mananciais, pluviometria, vazões afluentes e defluentes e consumos de água por categoria de usuários;
k) Implantar sistema de divulgação dos dados, informações e decisões de forma a trazer transparência ao setor e permitir que os cidadãos, as prefeituras e os diferentes segmentos econômicos possam se planejar;
l) Estruturar enfrentamento sanitário do desabastecimento de água, no que se refere à ampliação do monitoramento da qualidade da água pública distribuída, de bicas, nascentes e poços para lidar com ocorrências de doenças de veiculação hídrica;
m)Preparar as medidas jurídicas que possibilitem requisitar poços artesianos e todas as fontes disponíveis de água para direcioná-las aos usos prioritários da mesma forma que a frota de caminhões pipa existente, em especial de empresas que comercializam água a granel;
n) Divulgar para a sociedade todos os contratos de “demanda firme” para grandes consumidores, a quantidade de água fornecida, valor da tarifa, e rever esses contratos para avaliar a possibilidade de substituição por água não potável e qual a prioridade do uso atual;
o) Acelerar as obras capazes de ampliar em curto prazo a disponibilidade hídrica nas regiões metropolitanas de São Paulo e de Campinas;
p) Definir com transparência a quantidade de água potável que será disponibilizada para grandes consumidores (industria, comercio, agricultura e construção civil) enquanto perdurar a crise;
q) Administrar o calendário escolar a fim de preservar o cumprimento do ano letivo, garantindo a participação das representações dos alunos, pais e professores;
r) Intensificar o investimento em educação ambiental através dos meios de comunicação e diretamente em todos os bairros das cidades afetadas.

Por fim, esse coletivo conclama todos os movimentos e a sociedade a se unirem nessa luta na perspectiva de fortalecer o acesso a água de forma plena, com qualidade adequada e com controle social.

COLETIVO DE LUTA PELA ÁGUA Janeiro de 2015

APEOESP - Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo - ASSEMAE - Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento - CMP – Central de Movimentos Populares -CONAM - Confederação Nacional das Associações de Moradores - CUT – Central Única dos Trabalhadores – SP - De Olho nos Mananciais - Espaço Formação Assessoria e Documentação - FACESP - Federação das Associações Comunitárias do Estado de São Paulo - FNSA – Frente Nacional pelo Saneamento Ambiental - FNU – Federação Nacional dos Urbanitários - Fórum Paulista de Participação Popular - ISP – Internacional de Serviços Públicos - MAB – Movimento dos Atingidos por Barragens - Rede Nossa São Paulo - Sindae – Sindicato dos Trabalhadores (as) em Água e Esgoto de Campinas - Sintaema – Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente do Estado de São Paulo - União dos Movimentos de Moradia

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