domingo, 4 de janeiro de 2015

SOBERANIA ALIMENTAR PODE ESFRIAR O PLANETA E ALIMENTAR A POPULAÇÃO


VALE A PENA REFLETIR SERIAMENTE SOBRE O QUE É PROPOSTO E MOTIVO DE LUTA DA VIA CAMPESINA MUNDIAL: É POSSÍVEL PRODUZIR ALIMENTOS SADIOS AJUDANDO A ESFRIAR O PLANETA. VALE, POR ISSO, REFORÇAR SUAS LUTAS.


CARTA MAIOR - 26/12/2014 

Soberania alimentar: 5 passos para esfriar o planeta e alimentar sua população

Entre 44% e 57% de todas as emissões dos gases estufa provêm dos sistemas de alimentação globais. Entenda como isso funciona e as soluções para o problema.





La Via Campesina
CCAFS/2014/Prashanth Vishwanathan
Como a cadeia de produção global de alimentos contribui para o aquecimento global:

Desflorestamento: 15-18%

Antes que as plantações comecem, os tratores fazem seu trabalho. Pelo mundo todo, a agricultura industrial está se lançando sobre as savanas, as áreas úmidas e as florestas, lavrando uma enorme quantidade de terrenos. A FAO diz que a expansão da fronteira agrícola é responsável por volta de 70-90% do desflorestamento global, e a metade disto para a produção de alguns poucos commodities voltados à exportação. A parte agrícola do desflorestamento contribui com 15-18% das emissões globais de Gases do Efeito Estufa

Agricultura: 11-15%

Se reconhece que a agricultura contribui com 11-15% de todos os gases estufa produzidos no mundo. A maior parte destas emissões resultam do uso de insumos industriais, como fertilizantes químicos e combustível para os tratores e maquinário agrícola, assim como o excesso de estrume gerado pela criação de gado.

Transporte: 5-6%

A cadeia produtiva da alimentação atua como uma agência de viagens global. Plantações para a alimentação de animais podem ser feitas na Argentina, para alimentarem frangos no Chile, que serão exportados para a China, onde serão processados e comidos em McDonalds dos EUA. Muita da nossa comida, produzida sob condições industriais em lugares distantes, viajam milhares de quilômetros antes de alcançarem nossos pratos. Nós podemos estimar que o transporte de comida está ligada a um quarto dos gases estufa produzidos pelo transporte mundial, ou 5-6% do total destas emissões.

Processamento e embalamento: 8-10%

O processamento é um passo altamente lucrativo da cadeia industrial do alimento. A transformação de alimentos em refeições prontas, salgadinhos e bebidas necessitam de uma enorme quantidade de energia, principalmente na forma de carbono. Assim como o embalamento e enlatamento desta comida.

Comercialização e refrigeração: 2-4%

A refrigeração é o sustentáculo das cadeias de supermercado e fast food. Onde quer que o sistema industrial de alimentos vá, a cadeia da refrigeração o acompanhará. Considerando que a refrigeração é responsável por 15% de todo consumo de eletricidade no mundo, e que o vazamento de químicos são uma grande fonte de gases estufa, podemos dizer com segurança que a refrigeração dos alimentos contribui para cerca de 1-2% de toda a emissão de gases estufa. O comércio varejista contribui para outros 1-2%.

Desperdício: 3-4%

O sistema industrial de alimentos descarta mais da metade de toda comida que ele produz, jogada fora na longa jornada entre as fazendas e os distribuidores, os processadores de alimentos e os varejistas e restaurantes. Boa parte do que é desperdiçado apodrece em montes de lixo e aterros sanitários, produzindo uma quantidade substantiva de gases estufa. Entre 3,5-4,5% das emissões globais destes gases vêm do lixo, e mais de 90% deles são produzidos por materiais originários do sistema de produção de comida.

Soberania alimentar: 5 passos para esfriar o planeta e alimentar sua população.


1- Tomar conta do solo.

A equação comida/clima está baseada na terra. A expansão da agricultura insustentável no século passado levou à destruição de cerca de 30-75% do material orgânico das terra aráveis, e 50% do material orgânico nas pastagens e pradarias. Esta perda massiva de matéria orgânica é responsável por entre 25% e 40% do atual excesso de CO2 na atmosfera terrestre. Mas a boa notícia é que este CO2 que mandamos à atmosfera pode ser devolvido ao solo apenas restaurando as práticas que pequenos agricultores desenvolveram por gerações. Se as políticas e incentivos corretos forem colocados em prática no mundo todo, a matéria orgânica do solo poderia ser restaurada a níveis pré-industriais dentro de 50 anos - que foi mais ou menos o tempo que a indústria levou para reduzi-la. Isto iria compensar entre 24% e 30% de todos os gases estufa atuais.

2- Agricultura natural, sem químicos.

O uso de químicos na agroindústria está sempre aumentando, enquanto os solos estão cada vez mais empobrecidos e as pestes estão se tornando imunes aos inseticidas e herbicidas. No entanto, pequenos agricultores pelo mundo ainda possuem o conhecimento e a diversidade de culturas e animais para plantar produtivamente sem o uso de químicos e diversificando os sistemas, integrando agricultura e criação de animais, incorporando tudo isso à vegetação nativa. Estas práticas aumentam a produtividade potencial da terra pois melhoram a fertilidade do solo e previnem a erosão. A cada ano mais matéria orgânica é produzida no solo, possibilitando a produção de mais e mais comida.

3- Acabar com a distância da comida e focar em alimentos frescos

A lógica corporativa que resulta nos envios de comida ao redor do mundo não faz nenhum sentido do ponto de vista ambiental ou de qualquer outra perspectiva importante. O comércio global de comida, da abertura de trechos de terras e florestas para a produção de commodities agrícolas até a comida congelada vendida nos supermercados: estes são os principais culpados do sistema na contribuição às emissões de gases estufa. Muitas das emissões do sistema poderiam ser eliminadas se a produção de comida fosse reorientada na direção dos mercados locais e dos alimentos frescos, e longe das carnes baratas e comidas processadas. Mas alcançar este patamar é provavelmente a luta mais dura, enquanto os governos e as corporações estão comprometidos com a expansão do comércio de alimentos.

4- Devolvam a terra aos agricultores e parem com as mega plantações.

Nos últimos 50 anos, 140 milhões de hectares - o tamanho de todas as terras de agricultura da Índia - foram tomados por quatro culturas que crescem predominantemente em grandes plantações: soja, dendê, canola e cana de açucar. A área global sob estes e outros commodities agrícolas - todos notáveis emissores de gases estufa - irá aumentar se as políticas públicas não mudarem. Hoje, pequenos agricultores estão espremidos em menos de um quarto das terras, mas produzem a maior parte da comida mundial - 80% de toda comida em países não-industrializados, segundo a FAO. Pequenos agricultores produzem estes alimentos de maneira muito mais eficiente do que as grandes plantações, e de uma maneira melhor para o planeta. Uma redistribuição mundial das terras aos pequenos agricultores, combinada com políticas que ajudem a reconstruir a fertilidade do solo e políticas que apoiem os mercados locais podem reduzir os gases estufa pela metade em poucas décadas.

5- Esqueça as soluções falsas e foque no que funciona

Há um crescente reconhecimento de que a comida é central nas mudanças climáticas. Os últimos relatórios do IPCC reconheceram que a comida e a agricultura são grandes contribuintes das emissões de gases estufa e que as mudanças climáticas impõem desafios gigantescos à nossa capacidade de alimentar uma população em crescimento. Ainda não houve nenhuma vontade política para desafiar o modelo dominante de distribuição e produção industrial de comida. Ao invés disso, os governos e corporações estão propondo inúmeras falsas soluções. Há uma proposta vazia do Climate Smart Agriculture, que é essencialmente apenas uma repaginação da Revolução Verde. Há tecnologias novas e arriscadas como culturas geneticamente modificadas, para resistirem a secas ou projetos de geoengenharia de larga escala. Há projetos de biocombustíveis, que estão levando à grilagem de terras no Sul. E há os mercados de carbono, que permitem que os piores agressores do meio ambiente não precisem cortar suas emissões apenas transformando florestas e a terra de camponeses e indígenas em áreas de conservação. Nenhuma destas “soluções” funcionarão, pois elas trabalham contra a única solução efetiva: uma mudança do sistema industrial globalizado de alimentos, governado pelas corporações, em direção de sistemas de alimentação locais que estejam nas mãos dos pequenos agricultores.

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