Posição da Hutukara
sobre a Mineração em Terras Indígenas
Vocês, brancos, dizem que nós,
Yanomami, não queremos o desenvolvimento. Falam isso porque não queremos a
mineração em nossas terras, mas vocês não estão entendendo o que estamos
dizendo. Nós não somos contra o desenvolvimento: nós somos contra apenas o
desenvolvimento que vocês, brancos, querem empurrar para cima de nós. O
desenvolvimento que vocês falam em nos dar não é o mesmo que conhecemos: vocês
falam em devastar a nossa terra-floresta para nos dar dinheiro, falam que somos
carentes, mas esse não é o desenvolvimento que nós conhecemos. Para nós
desenvolvimento é ter nossa terra com saúde, permitindo que nossos filhos vivam
de forma saudável num lugar cheio de vida.
Nós Yanomami entendemos muito bem
sobre esse assunto e ficamos apenas preocupados com aqueles que dizem
representar todo nosso povo e pedem por mineração. São pessoas que ficam
pensando como as mineradoras funcionam, pensam que elas não devastam a
floresta, mas não entendem o que realmente vai ocorrer. A mineração não é como
o garimpo, não são pessoas que entram na floresta e degradam apenas algumas
regiões. A mineração precisa de estradas para transportar os minérios, precisa
de grandes áreas para guardar a produção, precisa de locais para alojar os
funcionários, fará grandes buracos na terra que não deixarão a nossa floresta
voltar a se recuperar.
Entendemos como as mineradoras
atuam, não pensem que confundimos seu trabalho com o dos garimpos. Conhecemos
muito bem a diferença, morremos muito na época do garimpo ilegal em nossa
terra, sabemos as diferenças. Sabemos que as mineradoras vão precisar de
energia para funcionar. De onde virá essa energia para fazer as máquinas
funcionarem? Como vocês transportarão os minérios? Quando os minérios mais
valiosos terminarem e as mineradoras forem embora, o que acontecerá com os
trabalhadores que foram até a terra indígena? Quando transformarem e produzirem
minério, quais são os resíduos que podem contaminar nossa terra por muito
tempo?
Vocês falam que somos pobres e que
nossa vida vai melhorar. Mas o que vocês conhecem da nossa vida para falar o
que vai melhorar? Só porque somos diferentes de vocês, que vivemos de forma
diferente, que damos valor para coisas diferentes, isso não quer dizer que somos
pobres. Nós Yanomami temos outras riquezas deixadas pelos nossos antigos que
vocês, brancos, não conseguem enxergar: a terra que nos dá vida, a água limpa
que tomamos, nossas crianças satisfeitas.
Vocês brancos pensam que nós somos
pássaros, ou somos cotias, para nos darem apenas o direito a comer os frutos
que nascem em nossas terras? Não pensamos as coisas de forma dividida, pensamos
na nossa terra-floresta como um todo. Se vocês destruírem o que está abaixo do
solo, tudo que está acima também sofrerá.
Não estamos preocupados apenas com o
que vai acontecer com os povos indígenas. Vocês pensam que os brancos não serão
afetados? Vocês não aprendem com o que está acontecendo no mundo? Está ficando
mais quente, em outros lugares o clima está mudando, os grandes rios estão
morrendo, os animais também estão morrendo e todos estão sofrendo. Vocês ainda
não aprenderam que esse tipo de desenvolvimento pode matar todos nós?
Não somos apenas nós, povos
indígenas, que vivemos na nossa terra. Vocês querem perguntar a todos os
moradores da floresta o que eles acham sobre a mineração? Então perguntem aos
animais, às plantas, ao trovão, ao vento, aos espíritos xapiri, pois todos eles
vivem na floresta. A floresta também pode se vingar de nós, quando ela é
ferida.
Sabemos que as leis do Brasil dizem
que o subsolo da terra pode ser explorado. Mas queremos garantir nosso direito
de escolher o que é melhor para nós, como as próprias leis brasileiras
garantem. Não pensamos que todos os povos indígenas são contra a mineração:
alguns não querem, outros querem. Mas queremos que seja discutido primeiro o
Estatuto das Sociedades Indígenas, porque as palavras do nosso Estatuto já
estão muito velhas. Queremos isso para garantir nosso direito de escolher.
Nós sabemos que existem muitos
interesses, mais fortes do que políticos, para fazer a mineração em nossa
terra. São interesses de quem tem muito dinheiro, de quem quer ganhar muito
mais dinheiro. Nós sabemos que não querem nos ajudar, eles dizem apenas que
querem nos ajudar, que farão escola, darão assistência à saúde, darão luz, mas
sabemos que por trás dessas palavras falsas está o desejo de fazerem crescer
seu dinheiro. Eles podem enganar outras pessoas, mas não nos enganam.
Nós Yanomami não queremos mineração,
não queremos que ela seja feita em nossa terra. Nós já nos manifestamos
contrários à Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI), que o governo
criou mas resolveu ignorar criando, depois, a Comissão Especial para discutir a
lei de mineração em terras indígenas. Se vocês brancos mostrarem um lugar onde
os povos indígenas vivem realmente bem com a mineração, um lugar onde vivem com
saúde, respeitando suas culturas, onde os brancos os ajudem de forma correta e
não os enganem ao darem dinheiro, onde não passem fome e onde não passem sede,
se virmos esse lugar, do mesmo tamanho que nossa terra-floresta, podemos voltar
a discutir esse assunto.
Vocês estão realmente escutando
nossas palavras? Vocês, brancos, realmente escutaram nossos palavras, as
palavras do povo da floresta?
Davi Kopenawa Yanomami
Presidente da Hutukara Associação
Yanomami (HAY)
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