Ivo Lesbaupin
Alguns analistas já observaram que o objetivo da intervenção federal no Rio de Janeiro parece ser desviar a atenção das questões sérias que o país tem de enfrentar, a desigualdade social em primeiro lugar.
Sou de um tempo em que “país desenvolvido é país industrializado”. Não sem razão Getúlio Vargas e, depois, Juscelino Kubitschek, foram considerados por muitos como os grandes presidentes que o país teve. Comparadas com outras ditaduras militares da América Latina, a nossa tinha um projeto de desenvolvimento nacional, investiu em empresas estatais, na Petrobras, na Eletrobrás, nos Correios e, durante anos, estas áreas – petróleo, eletricidade, correios – foram muito bem. (Isto não justifica em nada os 21 anos de ditadura, a perda da liberdade, as prisões, as torturas, as mortes e os desaparecimentos).
A partir da hegemonia neoliberal, começando com Collor, “governo bom é governo que paga as dívidas”. “Público é ruim, privado é bom”: começaram a vender aquelas mesmas empresas onde se tinha investido dinheiro público durante décadas para torná-las competentes e competitivas. Em menos de quinze anos, se desfizeram de nossas melhores empresas, a preço de banana. Apesar disso, a qualidade dos serviços não melhorou. Depois de Fernando Henrique, sobraram: a Infraero, a Petrobras, a Eletrobrás, o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, a Casa da Moeda, as Universidades Públicas e os Correios. Era suposto que a venda das estatais seria para pagar as dívidas. Mas, ao final do governo FHC, a dívida externa tinha aumentado e a dívida interna tinha decuplicado. Boa parte do patrimônio nacional foi embora e empresários do setor privado enriqueceram da noite para o dia.
Não se falou mais (não se fala mais) em industrialização, agora “país rico é pais que exporta produtos primários” (e, claro, que continua a pagar suas dívidas, para alegria dos bancos e do 1% da população que vive de rendas).
Esta foi a opção de FHC, opção não mudada significativamente por Lula nem por Dilma. Temer não se contenta em privatizar o que resta – a ELETROBRÁS está na linha de frente -, ele entrega também a tecnologia nacional aos estrangeiros. Não lhe basta entregar o petróleo, é preciso também se desfazer de uma das poucas empresas nacionais que se prezavam, a EMBRAER, que vai sendo adquirida pela BOEING, com a aprovação entusiástica da grande mídia. Sem falar no desinvestimento em ciência e tecnologia e no desprezo pelas universidades públicas, só reconhecidas pelos rankings internacionais.
Um dos candidatos à eleição presidencial já declarou que é favorável à privatização da Petrobras. É perfeitamente imaginável que os privatistas vão aproveitar o envolvimento de alguns setores da empresa em práticas de corrupção para justificar alienar este patrimônio nacional para o setor privado. A eles não interessam os recursos de todos os brasileiros que foram investidos durante mais de 60 anos para tornar esta empresa o que é. Do mesmo modo que entregaram a Vale do Rio Doce por uma bagatela, estão dispostos a entregar a nossa maior empresa e a nossa maior capacidade tecnológica. (Se a corrupção fosse motivo para uma empresa mudar de propriedade, nossas empreiteiras, em sua maioria, teriam de se tornar públicas).
O que vai ficando claro é que o governo atual não é “do Brasil”, ele é um representante dos interesses das multinacionais de origem estrangeira, tais as oportunidades que lhes oferece e a maneira como se desinteressa por manter a riqueza nacional, as empresas brasileiras, a tecnologia que conseguimos desenvolver.
Mais do que nunca temos de resistir ao impulso antidemocrático e antinacional que está em curso por parte de setores significativos de nossas elites.
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