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A soberania alimentar será camponesa ou não será
Diante da crise sanitária, coletivo de associações francesas assina manifesto pela proteção e pelo reconhecimento da agricultura familiar e camponesa como atividade de interesse público, e contra a ditadura econômica dos mercados imposta pela agroindústria
CARTA MAIOR -15/05/2020 12:26
Créditos da foto: (Reprodução)
Para nós, a soberania alimentar é muito mais do que uma simples resposta à necessidade de alimentos (1). Ela é pensada e iniciada coletivamente, com solidariedade entre os povos, e pode se tornar uma das bases de refundação de nossa democracia. A soberania alimentar incarna as aspirações, a capacidade e o direito das populações de um território de decidir sobre sua alimentação e, portanto, o direito de determinar o sistema alimentar desde os campos até a mesa, sem causar danos às agriculturas dos outros.
A soberania alimentar é uma democracia de iniciativa que escreve seu próprio destino alimentar e agrícola, englobando o vínculo com o território, a saúde, o meio ambiente, o emprego e o clima, com o claro objetivo de servir ao interesse comum, permitindo que uma alimentação de qualidade seja acessível a todos.
Enfrentamento das crises alimentares
Para escrever a história de uma verdadeira soberania alimentar e agrícola aqui e no exterior, acreditamos que é hora de reconhecer o papel central das agricultoras e dos agricultores. São elas e eles que nos permitirão enfrentar coletivamente as crises alimentares, climáticas e ecológicas de nossos territórios e de nosso planeta. Com seu conhecimento, autonomia sobre suas terras, vínculo com a terra e a natureza, bem como a resiliência de uma policultura e criações diversificadas, do pastoralismo ou ainda de agroflorestas e sistemas de pastos, elas e eles produzem alimentos saudáveis e de qualidade, que permitem uma gestão dos ecossistemas do nosso planeta adaptada à sua diversidade e às transformações do clima.
Além disso, a profissão de agricultor(a) é uma importante resposta à urgência social. Com muitos camponeses e camponesas instalados em pequenas propriedades, formam-se novas dinâmicas rurais e uma economia local se organiza na escala de todo um território. São milhares de empregos no campo de volta, que geram outros, de qualidade, no processamento agroalimentar e na distribuição. Iniciativas coletivas, solidárias e cooperativas são recriadas. Toda uma vida renasce em países antes negligenciados e esquecidos, com impactos nos serviços públicos, escolas, hospitais, cultura... Agora é hora de construir o pós-alimentação!
É por isso que precisamos de bem mais camponesas e camponeses. Queremos um milhão amanhã, e ainda mais depois de amanhã. Para atingir esse objetivo, exigimos que sejam tomadas hoje decisões que rompam claramente com a ditadura econômica dos mercados imposta pela agroindústria, e que reconheçam o valor da agricultura familiar e camponesa e do ofício de agricultoras e agricultores. Precisamos de muitos agricultores que dependem de uma lei fundiária que preserve e distribua a terra; de uma política de fixação massiva; de uma política agrícola comum baseada em geração de empregos e não em hectares.
Criação de laços duradouros
Camponesas e camponeses devem ser remunerados dignamente, com a regulamentação dos volumes e dos mercados para garantir preços justos e estáveis, e com a arbitragem pública das relações comerciais para garantir o direito à remuneração dos agricultores.
Agricultoras e agricultores devem ser protegidos e reconhecidos, suspendendo-se imediatamente todos os acordos de livre comércio; todo apoio à industrialização da agricultura deve ser interrompido, deve ser dado apoio financeiro para a transição agroecológica a fazendas autônomas e sustentáveis, e uma política agrícola e alimentar comum deve ser criada, a fim de criar laços duradouros entre camponeses e consumidores.
Essa crise deve abrir nossos olhos para a importância do trabalho no campo. Assim como os trabalhadores da educação e da saúde, camponesas e camponeses exercem profissões de evidente utilidade pública. Profissões que têm o poder de estruturar nossa vida coletiva em todos os territórios, e que devem ser a base sobre a qual construiremos uma sociedade mais social e ecologicamente justa: uma sociedade nova.
(1) O conceito foi desenvolvido pela Via Campesina e levado ao debate público por ocasião da Cúpula Mundial da Alimentação, em 1996. Desde sua origem, apresenta uma alternativa às políticas neoliberais aplicadas ao setor agrícola. A soberania alimentar designa o direito das populações, seus Estados ou uniões de definir sua política agrícola e alimentar, sem destruir a de outros países.
*Signatários: Nicolas Girod, porta-voz da Confédération paysanne, associação Abiosol, Khaled Gaiji, presidente da Friends of the Earth France, Aurélie Found, porta-voz da Attac France, Sylvie Bukhari de Pontual, presidente da CCFD-Terre Solidariedade, Fabrice Bouin, presidente da Civam, Raphaël Bellanger e Virginie Raynal, copresidentes da FADEAR, Alain Grandjean, presidente da Fundação Nicolas-Hulot, Benoît Teste, secretário geral da FSU, Jean-François Julliard, diretor-geral do Greenpeace França, Évelyne Boulongne, porta-voz da Miramap, Marie Pochon, secretária geral da Notre Affaire à Tous, Cécile Duflot, diretora-geral da Oxfam França, Slow food França, Clotilde Bato, delegada geral da SOL, Michel Vampouille , Presidente da Fédération nationale terre de liens, Françoise Vernet, Presidente da Terre & Humanisme, Éric Beynel, porta-voz da Union Syndicale Solidaires, Arnaud Schwartz, Presidente da France nature environnement.
https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/A-soberania-alimentar-sera-camponesa-ou-nao-sera/4/47507
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