A hora e a vez da bomba atômica tupiniquim?
Heitor
Scalambrini Costa
Professor
aposentado da Universidade Federal de Pernambuco
Historicamente a relação entre o uso da energia
nuclear para fins energéticos e para fins militares é muito estreita. O
Programa Nuclear Brasileiro surgiu durante a ditadura militar, e até hoje
atende demandas de setores das forças armadas, fascinados pelo poder que a
energia nuclear lhes traz, e com a justificativa da necessidade de proteção e
de segurança das nossas fronteiras, e de nossas riquezas.
No governo que tomará posse no próximo ano, o
Ministério de Minas e Energia (MME) terá como ministro um almirante da marinha
brasileira, pertencente ao grupo de interesse que vê a energia nuclear sob o
aspecto militar. Pela sua biografia, um defensor do uso da energia
nuclear.
Em entrevista concedida (FSP 7/12/2018), o futuro
ministro defendeu a conclusão de Angra III (usina com potência
instalada de 1.000 MW), onde já se investiu R$ 10 bilhões, e se
prevê mais R$ 16 bilhões para concluí-la. Um projeto dos anos de
1970, cuja tecnologia já está completamente ultrapassada, principalmente depois
dos desastres de Chernobyl, Three Mile Island e
Fukushima. Caso tal insanidade seja levada a frente, milhares de brasileiros e
brasileiras sofrerão sérios riscos de uma grande desgraça. Além de preços
finais da energia produzida ser o mais caro das fontes atuais. Em decisão que
fere os interesses do povo brasileiro, o Conselho Nacional de Politica
Energética (CNPE) em 9/10/2018, numa tentativa de viabilizar Angra III, dobrou
a tarifa que irá remunerar a energia produzida pela usina. Passando dos atuais
R$ 240,00/MWh para R$ 480,00/MWh. O que refletirá no aumento das contas de
energia para os consumidores de todo o Brasil, que pagarão por uma obra
indesejada.
Também nesta entrevista o futuro ministro do MME ,
defendeu, o projeto do submarino nuclear brasileiro, que completou dez anos em
2018, cuja responsabilidade é da marinha brasileira, e já consumiu R$ 21
bilhões em recursos públicos, valor corrigido pela inflação. O custo estimado total do
projeto, que inclui a construção do submarino nuclear, de quatro submarinos
convencionais e da base naval responsável pela construção e manutenção das
embarcações é hoje de R$ 32 bilhões.
Estas cifras mostram os vultuosos recursos
dispendidos pela União. Obviamente investimentos não
prioritários, quando verificamos as necessidades concretas para o
bom viver da população, como obras de saneamento, educação, saúde,
moradia, entre outras. Com recursos finitos disponíveis no país, as escolhas de
gastos dependem das prioridades definidas pelo governo de plantão. E o governo
eleito, a partir das declarações, nomeações e da constituição da “junta
militar”, sic! ministério; já mostrou suas reais intenções.
Um aspecto a ser ressaltado, e que não é dito
publicamente, mas está presente na cabeça dos militares e de muitos civis, é a
fabricação da bomba atômica. E assim o Brasil entrar no clube fechado dos países
detentores desta arma nuclear. Não seria a primeira vez desta tentativa.
Lembremos que um dos momentos mais sórdidos de nossa história foi o programa
nuclear clandestino/paralelo. Iniciado no governo Ernesto Geisel, tinha o
objetivo de garantir ao Brasil a tecnologia necessária para fabricar a bomba
atômica (e ogivas para mísseis nucleares). Logo, porque não acreditar, que o que
está por trás desta nomeação do almirante Bento Junior é a construção da bomba
atômica?
É claro que ninguém confirmará, pois nossa
constituição, e os acordos, pactos internacionais assinados pelo país proíbem a
construção deste artefato bélico. O próprio Decreto no 9.600,
de 5 de dezembro de 2018, consolidando as diretrizes sobre a Política Nuclear Brasileira,
somente se refere ao uso pacífico da energia nuclear. Diga-se de passagem que
este decreto, gestado pelo Comitê de Desenvolvimento do Programa
Nuclear Brasileiro, coordenado pelo gabinete de Segurança
Institucional da presidência da República, foi promulgado na surdina, as
vésperas do término de um governo sem nenhuma credibilidade e atolado em
denúncias de corrupção, sobre um tema no mínimo polêmico, sem nenhuma discussão
ampla e democrática.
Dispomos de grandes reservas de urânio. Sabemos
enriquecer o urânio, não somente para produção do combustível das usinas
nucleo-elétricas, mas também para atingir os níveis de enriquecimento
requeridos para a bomba. Além da aproximação “onde o céu é o limite”,
com os americanos, fundamental para “autorizar” a construção da bomba. Então o que está
faltando? Nada.
O momento é para um discussão com os diversos
setores da sociedade brasileira sobre o que deseja o povo brasileiro em relação
a energia nuclear. Produzir eletricidade a partir das usinas nucleares é ir na
contramão do que acontece no mundo, que
está se distanciado desta opção, em prol das fontes renováveis de energia (Sol,
vento, biomassa). E tornar o país detentor de uma bomba atômica não é o que necessitamos
e queremos.
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