Por Alceu Luís Castilho
Que a Câmara é ruralista ninguém duvida. Mas no Senado a proporção – inclusive em termos de quantidade de hectares por parlamentar – é ainda maior, como demonstrado no livro Partido da Terra. Essa realidade vem se perpetuando nas últimas décadas, e ganha uma ilustração eloquente na seguinte sequência de ruralistas: José Sarney, Renan Calheiros, ACM, Jader Barbalho, Edison Lobão, Ramez Tebet e Garibaldi Alves Filho.
Foram esses os senadores que presidiram a casa – ainda que por um dia, no caso de Lobão – nos últimos 22 anos. Quase todos pelo PMDB. O único ponto fora da curva foi Tião Viana (PT-AC), presidente por dois meses, em 2007, após escândalo envolvendo Calheiros. Todos eles têm histórico no setor agropecuário. A história de Sarney confunde-se com a história da grilagem no Maranhão. A ficha corrida de Barbalho mistura-se com a questão agrária. Calheiros é um coronel de fala mansa.
Eunício de Oliveira (PMDB) não entra como coadjuvante nessa lista. Megalatifundiário, ele tem em sua biografia ocupações de sua maior fazenda pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST). Os camponeses foram despejados, em 2015, em ação que reuniu 2 mil policiais. A agropecuária Santa Mônica possui 20 mil hectares de terra – segundo o MST, improdutivos. A fazenda é utilizada para lazer.
Não que essa seja a única faceta do senador cearense, descrito por alguns delatores como o Índio da lista da Odebrecht, na Operação Lava-Jato. Mas a declaração de bens de Eunício não deixa dúvidas: em 2014, candidato derrotado ao governo do Ceará, ele informou possuir R$ 99 milhões. A lista é encabeçada por 79 propriedades rurais em Goiás. Depois ainda vêm a Santa Mônica Agropecuária, no valor de R$ 11,5 milhões, e mais R$ 5 milhões em gado. Em 2009, eram 24 mil bois.
Mas a lista de propriedade rurais continua, com mais 13 fazendas. No total são 92 imóveis, portanto. O mais barato, um imóvel de 14 hectares chamado Lages, em Corumbá de Goiás, adquirido em 1994: R$ 746,27. O senador ainda declarou cinco fazendas por apenas R$ 1.000 cada. Um sítio em Mangabeira (CE) foi declarado por R$ 2.209,84. As duas propriedades rurais mais caras, em Corumbá de Goiás, aparecem na lista do senador no preço de R$ 800 mil cada.
O GADO QUE PISA NA COMIDA
Nem sempre o senador declara seu gado, como observou, na segunda-feira, o Estadão. Em 2010, com uma fortuna bem menor (R$ 37 milhões) que os atuais R$ 99 milhões, não declarou. (Em 2009, os dados eram da Agrodefesa do Estado.) Em 2006, eleito pela terceira vez deputado federal, também não. Em 2002, quando ele tinha quatro rádios no Ceará, igualmente não. E em 1998, em sua estreia no Congresso, quando ele se apresentou como “empresário e produtor de espetáculos públicos”? Não.
Até 2002 o senador tinha o hábito de informar à Justiça Eleitoral o tamanho das propriedades. Naquele ano ele possuía 8.305 hectares em terras – excetuadas aquelas em nome da agropecuária Santa Mônica.
Uma reportagem de 2014 da CartaCapital relata a pressão feita pela Santa Mônica contra pequenos proprietários em Alexânia (GO) e Corumbá de Goiás para que vendessem as terras e deixassem a região. A reportagem pode ser lida aqui: “A boiada de Eunício“.
A produção feita pelos camponeses do MST durante a ocupação de 2015 (arroz, feijão, milho, mandioca, abóbora, alface, couve, amendoim, gergelim) teve um destino peculiar, após a reintegração de posse: foi pisoteada pelo gado.
NO RIO, JORGE PICCIANI
Eunício de Oliveira não é o único chefe ruralista do Legislativo no Brasil. A Assembleia Legislativa do Rio reconduziu ao cargo, pela quinta vez, o deputado Jorge Picciani (PMDB), dono de fazenda em Goiás onde já foi flagrada a exploração de trabalhadores em situação de trabalho escravo.
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