ATENÇÃO, SENHORES PREDADORES DE ÁGUA E DE FLORESTAS: CHEGARÁ O DIA, E NÃO DEMORARÁ MUITO, QUE O POVO FARÁ O NECESSÁRIO PARA SALVAR RIOS, PARA EXIGIR QUE SE PLANTEM FLORESTAS, PARA GARANTIR ÁGUA! NÃO DIGAM, NESSE DIA, QUE OS BÁRBAROS FORAM AS PESSOAS QUE FIZERAM O NECESSÁRIO PARA SALVAR A VIDA. EM LUGAR DISSO, ARREPENDAM-SE DE SUAS BARBARIDADES QUANTO ANTES!
Quem tiver interesse em assinar a nota em apoio às
populações atingidas, contactar
NOTA DAS ENTIDADES DA REGIÃO: Cansado
do descaso das autoridades, o povo de Correntina reage em defesa das águas
A mídia está a noticiar que na manhã de
quinta-feira, 02/11/2017, feriado de Finados, houve manifestação de populares
nas Fazendas Igarashi e Curitiba, no distrito de Rosário, município de
Correntina. Segundo imagens e áudios que circulam pela Internet, estas fazendas
teriam sido invadidas e parte de suas máquinas, instalações e pivôs quebrados e
incendiados, e que os autores destas ações são populares de Correntina. Segundo
os relatos participaram da ação entre 500 a 1.000 pessoas.
O Oeste da Bahia tem se destacado como
produtor de grãos para exportação, referência para o agronegócio nacional, cada
vez mais de interesse internacional. Está inserido no MATOPIBA – projeto
governamental de incentivo a esta produção nos estados do Maranhão, Tocantins,
Piauí e Bahia – atual fronteira agrícola brasileira, onde estão localizados os
últimos remanescentes de Cerrado no Brasil. É nesta região onde se encontram os
rios Carinhanha, Corrente e Grande, suas nascentes, subafluentes e afluentes,
principais contribuintes com as águas do rio São Francisco na Bahia,
responsáveis por até 90% de suas águas no período seco. São estas águas que
abastecem milhares de comunidades rurais e centenas de municípios baianos e dos
outros estados do Submédio e Baixo São Francisco.
Os conflitos causados pela invasão da
agropecuária, desde os anos 1970, no que eram os territórios tradicionais das
comunidades que habitam o Cerrado, têm sido pauta de uma intensa discussão, e
de dezenas de audiências públicas. A gravidade destes conflitos é de
conhecimento regional, estadual, nacional e até internacional. Contudo, ao longo
de décadas o agronegócio nunca assumiu a responsabilidade por sua nefasta
atuação, alicerçada num tripé que tem como eixos centrais: a invasão de terras
públicas por meio da grilagem e da pistolagem; o uso de dinheiro público para
implantação de megaestruturas e de monoculturas de grãos e pecuária bovina; o
uso irresponsável dos bens naturais, bens comuns, com impactos irreversíveis
sobre o ambiente, em especial, sobre a água e a biodiversidade, além de
imensuráveis impactos sociais.
A ação do povo de Correntina não é de
agora. Assistindo à sequência de morte de suas águas essenciais, diante do
silêncio das autoridades, ações do tipo e outras vêm sendo feitas há mais
tempo. Em 2000, populares entupiram um canal que pretendia desviar as águas do
mesmo rio Arrojado agora ameaçado pelas fazendas no distrito de Rosário. O
canto fúnebre das “Alimentadeiras de Alma”, antiga tradição religiosa de rezar
pelos mortos, passou a ser realizado para chamar a atenção para a morte das
nascentes e rios às centenas na região. Romarias com milhares de pessoas vêm
sendo feitas nos últimos anos em cidades da região em protesto contra a
destruição dos Cerrados.
As ações do agronegócio possuem a
chancela do Estado baiano e brasileiro, que age como incentivador e promotor, é
insuficiente ou omisso nas fiscalizações e tem sido conivente com a sua
expansão por meio da concessão de outorgas hídricas e licenças ambientais para
o desmatamento, algumas sem critérios bem definidos. Estes critérios que vêm
passando por intensas flexibilizações com as mudanças radicais na legislação
ambiental. O Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos – INEMA concedeu à
Fazenda Igarashi, por meio da Portaria nº 9.159, de 27 de janeiro de 2015, o
direito de retirar do rio Arrojado uma vazão de 182.203 m³/dia, durante 14
horas/dia, para a irrigação de 2.539,21 ha.
Este volume de água retirada equivale a
mais de 106 milhões de litros diários, suficientes para abastecer por dia mais
de 6,6 mil cisternas domésticas de 16.000 litros na região do Semiárido. Agrava-se
a situação ao se considerar a crise hídrica do rio São Francisco, quando neste
momento a barragem de Sobradinho, considerada o “coração artificial” do Rio,
encontra-se com o volume útil de 2,84 %. A água consumida pela população de
Correntina aproximadamente 3 milhões de litros por dia, equivale a apenas 2,8%
da vazão retirada pela referida fazenda do rio Arrojado.
Alegar que as áreas irrigadas no Oeste
da Bahia representam apenas 8% da região, ou seja, 160 mil hectares num
universo de 2,2 milhões de hectares, não minimiza seus impactos.
Megaempreendimentos e suas obras de infraestrutura em plena construção com
vistas à expansão das áreas irrigadas determinam uma rota de cada vez maior
devastação. Alguns exemplos: Fazenda Santa Colomba, em Côcos, Fazendas Dileta;
Celeiro e Piratini, em Jaborandi; Fazendas Sudotex, Santa Maria e Igarashi, em
Correntina. Algumas destas fazendas estão construindo centenas de quilômetros
de canais, dezenas de reservatórios (piscinões), perfuração de centenas de
poços tubulares e instalação de centenas de pivôs. Quanta água está sendo
comprometida com tudo isto? Se a irrigação não fosse uma tendência regional,
como explicar tantos investimentos neste modelo de agricultura? Comitês e
Planos de Bacia e outras medidas no campo institucional, antes promovem esta
rota insana, do que preservam os bens comuns da vida, hoje e de amanhã.
A ganância do agronegócio e as
conveniências dos que representam o Estado são os responsáveis pelo desespero
do povo. Não há ciência no mundo que possa estimar um valor monetário para o
rio Arrojado, e isso o povo de Correntina parece compreender bem. Os próceres
do agronegócio agem com hipocrisia e continuam se negando a assumir o passivo
socioambiental existente no Oeste Baiano. Não resistem a uma mínima comparação
com o modo de produzir dos pequenos e médios agricultores, que fornecem os
alimentos diversos que a população consome com impactos infinitamente menores e
muito mais cuidados de preservação. Não há como evitar a pergunta: os equívocos
dos processos para outorgas hídricas e licenciamentos ambientais e a falta de
fiscalização eficiente dos órgãos responsáveis são garantias para a legalidade
e legitimidade do agronegócio?
Diálogo com os representantes do
agronegócio tem sido um simulacro de democracia e honestidade. Na
audiência pública havida em Jaborandi, no dia 27/10/2017, para discutir a
questão das águas, outorgas e legislação ambiental, com interessados dos
municípios de Jaborandi, Coribe e Correntina, populares foram impedidos de questionar
a tese, na ocasião defendida por conhecido cientista aliado do agronegócio, de
que não há relação entre a ação humana e as mudanças climáticas.
Flagrantes contradições do modelo de
desenvolvimento regional são inúmeras e precisam ser evidenciadas. Por exemplo,
a de que é muito maior a área preservada de Cerrado em relação à explorada.
Omite-se que as áreas de Reserva Legal das fazendas do Oeste da Bahia estão
sendo regularizadas por meio da “grilagem verde” sobre os territórios das
comunidades tradicionais, e que a função ecológica cumprida pelas Áreas de
Preservação Permanente – APPs, aos longo dos cursos d’água, nas áreas de
descarga, são diferentes das funções ecológicas que cumprem os chapadões
responsáveis pelo abastecimento do aquífero Urucuia, áreas de recarga, que já
foram dizimadas pelo agronegócio.
A luta em defesa da vida mais uma vez é
marcada pelo protagonismo popular de quem faz com as mãos a história e sabe que
a água não é mercadoria, como quer convencionar o agronegócio, inclusive
utilizando-se da Lei 9.433/1997, a “Lei das Águas”. As águas do rio Arrojado
abastecem comunidades centenárias e não podem servir apenas aos interesses dos
irrigantes como o grupo Igarashi, que chega à região com a má fama de ter que
migrar da Chapada Diamantina, uma das regiões da Bahia que sofrem com a crise
hídrica, em especial, na bacia do rio Paraguaçu, justamente por conta dos
impactos de sua exploração. Os conflitos ambientais parecem não findar com o
caso das fazendas deste grupo, pois esta é apenas uma fazenda num universo de
inúmeras do Oeste da Bahia. Tudo indica, portanto, que o cansaço do povo frente
ao arrojo do agronegócio e ao descaso das autoridades e a urgência da defesa da
vida seja o argumento que impõe esta reação.
Deste modo e diante da notória crise
hídrica, somada à irresponsabilidade arrogante do agronegócio e à incompetência
do Estado, tal cenário coloca o povo em descrença e desespero, ao ver o rio
Arrojado, base para sua convivência e modo de vida, com tamanhos sinais de
morte, assim como inúmeros riachos, nascentes, veredas e rios da região. E,
então, partem para alguma reação concreta, que chame a atenção dos responsáveis
públicos e privados. Não há palavras para descrever o sentimento coletivo que
tomou conta do povo de Correntina, que num ímpeto de defesa agiu para
defender-se, pois sabe que se não mudar o modelo de “desenvolvimento”, baseado
no agronegócio, estarão comprometidas as garantias de vida das populações
atuais e futuras.
Novembro de 2017.
Agência 10envolvimento
Articulação Estadual dos Fundos e
Fechos de Pasto da Bahia
Associação de Advogados/as de
Trabalhadores/as Rurais da Bahia – AATR/BA
Coletivo de Antônia Flor – Assessoria
Técnica e Popular em Direitos Humanos
Comissão Pastoral da Terra – CPT/BA
Conselho Pastoral dos Pescadores –
CPP/MG
Fundação de Desenvolvimento Integrado
do São Francisco – FUNDIFRAN
GeograFAR/UFBA
Levante Popular da Juventude
Licenciatura em Educação do Campo:
Ciências Agrárias/UFRB
Movimento dos Trabalhadores Sem Terra –
MST
Movimento dos Pequenos Agricultores –
MPA
Movimento dos Atingidos por Barragens –
MAB
Movimento Estadual dos Acampados,
Assentados e Quilombolas da Bahia – CETA
Pastoral da Juventude do Meio Popular –
PJMP – Diocese de Bom Jesus da Lapa
Pastoral do Meio Ambiente – PMA –
Diocese de Bom Jesus da Lapa.
Programa de Pós- Graduação em Educação
do Campo/UFRB, Mestrado Profissional em Educação do Campo
Rede Nacional de Advogados e Advogadas
Popula
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