domingo, 5 de outubro de 2014

VELHO CHICO

MAIS UM POEMA, AGORA SOBRE O SÃO FRANCISCO. QUE NOS AJUDE A COMPREENDER PORQUÊ SUA VIDA É INDISPENSÁVEL PARA A VIDA DE MUITAS PESSOAS. PENSANDO BEM, PARA A VIDA DE TODAS AS PESSOAS E DE TODA A VIDA DA TERRA.

                                   Rio das Rimas
- Lembrando Guilherme de Almeida no dia de São Francisco -


Roberto Malvezzi (Gogó)

E ele que nasce pequenino,
franzino, feito um menino
Como que juntando gota a gota
Depois cresce, aparece
E de um fio de pavio
Se torna um rio.

Vai descendo esguio
feito uma serpentina
Que dobra na esquina
E cintila na luz matutina.

Vai deslizando na terra,
Contornando as serras,
Como que contornando
As curvas dos corpos das meninas

E ele que deveria descer para o sul
Decidiu subir para o norte
Por sorte mergulha no coração
De quem vive no sertão.

E desce lento, devagar
Como um bicho preguiça
Porque não precisa pressa
Dessa que o atormenta
Pelas mãos sangrentas
De seus inimigos.

Pois ele já sabe
Que basta caminhar
Pois o destino de um rio
Como já dizia mestre Paulo Freire
É um dia tornar-se mar.

E onde passa só deixa vida.

E deixa nomes
João, José, Maria,
Toinha, Aninha, Mariquinha
Bidó, Trajano, Herculano
Numa lista infinda
De gente sofrida e bonita
De gente permanente e errante
Que rima com Bom Jesus da Lapa,
Bom Jesus dos Navegantes
Ou com nomes do coração
Como Senhora da Soledade
E Maria da Conceição.

E desce machucado, violado, desmatado, estuprado
Carrega nas veias venenos, esgotos, agrotóxicos,
E tem seu corpo sangrado,
Retalhado, capado e
Recapado.

Parece que morre, mas não morre
Permanece com vida,
E as aves, os peixes, os bichos e as árvores
Ainda tem lugar para viver ao seu lado.

Por isso é um Velho Chico
Sempre velho e sempre novo
Que quase morto vive no coração do povo
E que agora pede socorro.

Um rio que tem nome de santo
Que canto, me encanto, não canso de falar
Um rio bonito, bendito, que parece infinito
Cujo nome sempre relembro e sempre repito:
Rio São Francisco.

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