É FUNDAMENTAL DEIXAR CLARO: SÃO PESSOAS, POVOS, PAÍSES EMPOBRECIDOS, POIS SUA SITUAÇÃO TEM TUDO A VER COM A VERGONHOSA HISTÓRIA DAS COLONIZAÇÕES MODERNAS, COM O ROUBO DOS MINÉRIOS E OUTROS BENS NATURAIS, COM A DOMINAÇÃO E EXPLORAÇÃO ECONÔMICA, POLÍTICA E CULTURAL PRATICADA PELOS PAÍSES E CORPORAÇÕES INTERNACIONAIS SOBRE ESTES POVOS ATÉ OS DIAS DE HOJE.
QUANDO SE CHEGAR À COBRANÇA DAS DÍVIDAS HISTÓRICAS, ECOLÓGICAS E ECONÔMICAS, OS RICOS PODERÃO VER A VERDADE DE SUA ORGULHOSA "CIVILIZAÇÃO" E OS EMPOBRECIDOS RECUPERARÃO A CONDIÇÃO DE VIVER EM CONDIÇÕES HUMANAS LIVRES E DIGNAS.
Outras
Plavras – 03/10/2013
Acidente de hoje eleva a 6 mil número de migrantes mortos no Mediterrâneo,
na última década. Na foto, afundamento em abril de 2011
Morte de dezenas de africanos na Itália expõe condições dramáticas em
que vivem 250 milhões de pessoas, superexploradas por corporações e governos
ricos
Por Thalif Deen, na Agência IPS | Tradução: Antonio Martins
O número de migrantes internacionais continua a crescer inexoravelmente,
mesmo em vista da multiplicação de relatos sobre trabalho escravo. O número de
pessoas que vivem e trabalham fora de seus países de origem chegou ao recorde
de 232 milhões de pessoas – que geram mais de 400 bilhões de dólares anuais em
remessas de recursos. A cifra também não param de crescer. Ela já é, segunda a
ONU, quase quatro vezes maior que a ajuda ao desenvolvimento prestada pelos
países ricos aos mais pobres,
Os rios de dinheiro que fluem para os países em desenvolvimento – entre
eles, Índia, Bangladesh, Marrocos, México, Sri Lanka, Nepal, Egito e Filipinas
– é um dos efeitos mais positivos da migração. Mas o que é benção para alguns,
torna-se calamidade para outros. No lado obscuro, estão a contínua exploração
dos migrantes, em especial no Oriente Médio, os baixos salários, o cuidado
médico inadequado e condições atrozes de trabalho.
Jaseph Chamie, um ex-diretor da Divisão de Populações da ONU que
escreveu vastamente sobre migrações internacionais, afirmou à Agência IPS que
embora haja condenação internacional do trabalho “escravo” de estrangeiros, é
difícil fazer valer as normas de proteção, porque o trabalho é em geral
realizado em residências e pequenas empresas. Uma estratégia para enfrentar o
problema é a Convenção para Trabalho Doméstico da Organização Internacional do
Trabalho (OIT), que entrou em vigor no mês passado.
Ao falar na abertura de um encontro de alto nível sobre migração
internacional e desenvolvimento, Abdelhamid El Jamri, diretor do Comitê sobre
Direitos dos Trabalhadores Migrantes (CMW, em inglês), frisou nesta
quarta-feira (2/10) que os migrantes não são mercadorias. “Mudar os padrões de
migração, enfrentando a exploração e as discriminações enfrentadas por eles em
ramos como agricultura e construção civil tornou-se mais crucial que nunca”,
disse ele.
A Convenção Internacional sobre os Direitos dos Migrantes e suas
Famílias (ICRMW, em inglês) é um dos tratados internacionais mais importantes
sobre direitos humanos. No entanto, embora tenha sido aprovada há dez anos, ela
foi ratificada por apenas 47 dos 193 países-membros da ONU. Nenhum dos grandes
destinos de migrantes – Estados Unidos, países da União Europeia e nações do
Golfo Pérsico, onde milhoes de imigrantes vivem e trabalham – a endossou, até
agora.
Indagado sobre o encontro de alto nível da ONU, marcado para 3 e 4 de
outubro, Joseph Chamie afirmou que devido às realidades políticas atuais e aos
contínuos atritos entre países que importam e exporatam mão-de-obra, “é
improvável que o evento resulte em algo além de palavras”
A divisão aguda entre os dois lados, disse ele, relaciona-se a temas
como reunificação das famílias, direitos dos migrantes, trabalhadores
indocumentados e responsabilidade partilhada. Kul Gautam, um nepalês que foi
secretário-geral assistente da agência da ONU para a infância (Unicef), afirma
que as rendas dos migrantes são hoje a principal fonte de renda nacional em seu
país. As remessas equivalem a cerca de 25% do PIB do país. Dos 400 mil jovens
adultos que entram no mercado de trabalho a cada ano, cerca de 300 mil procuram
migrar. A maior concentração deles está no Qatar e na Malásia (cerca de 400 mil
em cada país).
Gautam critica o tratamento áspero dispensado aos migrantes, em especial
nos países do Golfo Pérsico. Ele afirma que as denúncias mais recentes de
escravidão contemporânea em massa referem-se ao Qatar – um dos países mais
ricos do mundo, que emprega trabalhadores nepaleses na construção da
infraestrutura para a Copa do Mundo da FIFA, em 2022. Uma reportagem
investigativa recente do jornal britânico The Guardian descreve um
quadro dramático, de milhares de trabalhadores forçados a condições inumanas,
sem receber pagamento por longos períodos e desprovidos de equipamento de
segurança. O governo do Nepal anunciou esta semana que 70 migrantes nepaleses
morreram nas obras da Copa-2022, nos últimos dois anos.
Em relação ao endurecimento das normas internacionasi, Gautam afirmou:
“é difícil dizer se o diálogo de alto nível [desta semana] terá impacto
significativo. Mas seria necessário”. No Nepal, pouquíssimas pessoas foram
informadas do encontro, ele lembrou, acrescentando: “duvido que a delegação do
país esteja preparada e tenha propostas concretas”. Mas também frisou: “Penso
que, no Nepal e em diversos outros países, a migração é um tema mais importante
para o desenvolvimento que o comércio, a ajuda internacional ou o investimento
direto.
Para fazer justiça, prosseguiu Gautam, o governo do Qatar não é o único
a praticar ou acobertar condições semelhantes às de trabalho escravo. Empresas
privadas, contratantes e intermediários são os principais responsáveis por tais
práticas desumanas. Indagado sobre possíveis ações da ONU para prevenir tais
abusos, Joseph Chamie afirmou que o tema não está entre as prioridades das
Nações Unidas. Em contraste com outros temas globais, como infância, comércio,
meio ambiente, finanças, mulheres e idosos – todos eles, foco de conferências
globais – a migração internacional é “uma criança rejeitada”.
“Por enquanto, e no futuro previsível, é um tema fora do sistema ONU”,
prosseguiu. Indagado sobre as razões para tanto, afirmou: “Os países de destino
dos migrantes, especialmente os mais ricos, não desejam ver o tema tratado
pelas Nações Unidas”.
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