Mesmo com alguma demora, disponibilizo hoje a Carta elaborada e publicada pelo Atingidos participantes do Seminário Atingidos por Eventos Climáticos Extremos, organizado pelo Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Social em Brasília, nos dias 10 a 12 de setembro de 2011.
Desejo que esta Carta seja lida e ouvida como o grito dos Atingidos brasileiros, e como um convite para somar-se a eles para conseguir as políticas públicas necessárias para a prevenção e para a garantia dos direitos dos atingidos por desastres socioambientais.
Nos dias 10 a 12 de setembro de 2011, nos reunimos em Brasília, Distrito Federal, para discutir as questões relacionadas aos desastres causados por eventos climáticos extremos que sofremos na pele em várias regiões do Brasil nos últimos anos. Foram enchentes, deslizamentos de terra, secas, tornados, chuvas de granizo, trombas d’água, mudança das marés, assoreamento de rios. Muitas pessoas morreram e muitos perderam tudo o que tinham na vida: suas casas, seus familiares e o fruto de seu trabalho. Esses eventos extremos são causados pela má utilização do solo, da água e do ar, emissão de gazes causadores do aquecimento global, desmatamento das florestas, dos mangues e das matas ciliares dos rios e nascentes, uso de agrotóxicos e fertilizantes químicos, queimadas, construção de grandes barragens hidrelétricas e usinas nucleares, falta de manejo adequado do lixo, poluição por resíduos domésticos e industriais, carcinicultura, monocultura em todas as suas espécies, como soja, eucalipto, pinus, cana e pecuária, e por fim por um modelo de desenvolvimento que visa o lucro acima de tudo, sem considerar as conseqüências para as vidas que são colocadas em risco pelas atividades que agridem o meio ambiente.
Sabemos que os verdadeiros causadores dos fatores que levam aos desastres são as grandes indústrias, a produção e o uso de combustíveis fósseis, o agronegócio e as multinacionais todas em sua busca irresponsável por produtividade e lucro, o Governo Brasileiro que não prioriza a sustentabilidade em suas políticas públicas e que além de permitir, incentiva em todas as suas instâncias financeiramente as atividades destruidoras do meio ambiente. E por fim, os países ricos, grandes causadores das emissões de gases e que não aceitam reduzir suas emissões para evitar o agravamento do aquecimento do planeta.
No entanto, quem sofre as conseqüências somos nós. Nas áreas vulneráveis os governos tratam a questão com descaso. As políticas de defesa civil não são implementadas, os sistemas de alerta de desastres não funcionam, os governantes usam de forma demagógica o sofrimento das pessoas, e quando os desastres acontecem, a maior parte dos recursos públicos enviados para as comunidades não chegam aos necessitados. Até mesmo parte das doações enviadas por solidários de todos os cantos do país e do mundo são desviadas por autoridades corruptas e desalmadas.
Agradecemos de todo o coração a solidariedade enviada pelas boas pessoas espalhadas pelo Brasil e pelo mundo que se sensibilizaram perante o nosso sofrimento enviando donativos que, quando chegaram a nós, ajudaram a amenizar as nossas dores e a aquecer os nossos corações, renovando as nossas esperanças naquele momento angustiante de tão grandes perdas.
Pedimos à sociedade que se una a nós no esforço de buscar alternativas que evitem que milhares de outras famílias venham a sofrer as dores que sentimos e que ainda estamos sentindo, pelas consequências dos desastres que nos atingiram. É preciso seriedade dos 3 níveis de poder no tratamento da questão ambiental. Precisamos também reduzir as emissões de gases que provocam o aquecimento global interferindo no clima e causando os eventos extremos. Precisamos mudar o modelo de desenvolvimento, baseado no consumo desenfreado, e buscar alternativas que objetivem a sustentabilidade e a racionalidade na produção e no consumo de produtos e ainda na geração de energia, buscando uma relação harmônica com a natureza. Precisamos praticar o bem-viver. Precisamos que a sociedade se una a nós na criação de um movimento nacional que dê o passo seguinte nessa luta. Pressione os governos para criar políticas publicas que reduzam a vulnerabilidade das comunidades, aumentem as instancias de participação popular, implementem sistemas de prevenção, salvação e reconstrução.
A luta por justiça social, dignidade e respeito no nosso pais é árdua. Nosso compromisso é lutar pela melhoria das condições de vida dos atingidos e para evitar novos sofrimentos com os eventos extremos causados pelas mudanças climáticas.
Brasília, 12 de setembro de 2011.
Atingidos e atingidas por eventos climáticos extremos dos seguintes Estados:
Maranhão, Piauí, São Paulo, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Alagoas, Santa Catarina, Pará, Rio Grande do Sul, Amazonas, Bahia, Sergipe, Ceará, Mato Grosso do Sul, Pernambuco e Mato Grosso.
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