domingo, 3 de março de 2019

O SÍNODO PAN-AMAZÔNICO

Roberto Malvezzi (Gogó) *
“Amazônia: novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral”. Esse é o lema do Sínodo Pan-Amazônico que acontecerá em outubro de 2019, em Roma. Sínodo vem do grego e quer dizer “caminhar juntos”. Para entender o papel desse Sínodo, é preciso entender um pouco a história da Amazônia.

A Amazônia, do ponto de vista da história natural, surgiu há 70 milhões de anos, com o soerguimento dos Andes. Antes os rios amazônicos desaguavam no Pacífico. Depois as águas percorreram outros caminhos para desaguar no Atlântico. Porém, seu rosto atual só vai ficar definido a partir do término da última era glacial, há 12 mil anos. Então, a região que era um misto de savanas, caatingas e áreas de refúgio de floresta densa, torna-se o imenso bioma que hoje existe.

Do ponto de vista social-histórico, o tratado de Tordesilhas, em 1492, entre Espanhóis e Portugueses, já delimitava que as terras a Leste seriam de Portugal e as do Oeste pertenceriam aos Espanhóis. A ocupação foi lenta e somente no Tratado de Madrid, em 1750, ficou acordado que as terras pertenceriam a quem as ocupasse efetivamente. Então, basicamente nasce aí a geografia entre as terras portuguesas e espanholas no continente. Os processos libertários da América Latina a partir de 1808 vão dar a reconfiguração geopolítica que perdura até hoje.

A Igreja Católica está presente na Amazônia desde o período colonial e praticamente chegou junto com portugueses e espanhóis.

Então, em Outubro acontecerá o Sínodo da Igreja Católica para a Pan-Amazônia. Faço alguns esclarecimentos sobre o Sínodo, já que faço parte como “olho de fora” do núcleo de assessoria da REPAM-Brasil (Rede Eclesial Pan-Amazônica), que colabora de forma decisiva na preparação do Sínodo.

Primeiro, em 2014 foi criada a Rede Eclesial Pan-Amazônica. Os fundadores são o Conselho Episcopal Latino Americano (CELAM), Conferência dos Religiosos da América Latina e Caribe (CLAR), a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e a Cáritas. Já havia iniciativas anteriores nessa linha, porém, mais na dimensão episcopal. A REPAM abrange as bases da igreja e outros setores da sociedade interessados numa Igreja em Rede e na Ecologia Integral.

Essa criação deriva da posição do episcopado Latino-americano, definida no documento de Aparecida, que entende que “Jesus nos fala a partir da Amazônia”, isto é, seus povos e toda a exuberância da criação. É o princípio evangélico dos “sinais do tempo”.

A REPAM abrange o Brasil e os demais oito países nos quais há o bioma Amazônia: Bolívia, Equador, Colômbia, Peru, Venezuela, República da Guiana, Suriname e Guiana Francesa. Essa última não é um país, mas um território francês no continente da América do Sul. O propósito é criar uma Igreja em Rede, de povos, instituições, igrejas, que defendam os povos e a natureza amazônica.
O Papa Francisco, que foi um dos redatores do documento de Aparecida, decidiu convocar um Sínodo para toda Igreja da Amazônia, mas que é um Sínodo da Igreja Universal. Por isso, além de aproximadamente 140 bispos da Amazônia, haverá mais pessoas de outros lugares do mundo.

A REPAM não é o único grupo a preparar o Sínodo, mas cumpre um papel destacado por decisão de Roma. O próprio Francisco esteve em Puerto Maldonado, Peru, exclusivamente para ouvir os povos originários. Ele disse que ali começava o Sínodo. Ouvir quem nunca foi ouvido, talvez seja esse o elemento mais incomodante para muitos setores da sociedade.

Como preparação para o Sínodo, sobretudo a REPAM-Brasil, realizou uma série de seminários pelos mais diversos pontos da Amazônia, dialogando a realidade local com a encíclica Laudato Sí, do Papa Francisco. Só no Brasil foram feitos 16 seminários regionais e um 17º nacional. Porém, outros países também realizaram intensamente esses debates, reunindo povos indígenas, ribeirinhos, universidades, comunidades eclesiais, pessoas de outras religiões, enfim, todos que se preocupam com uma ecologia integral.

Posteriormente chegou de Roma um questionário para colher as mais diversas opiniões dos povos sobre a Igreja que queremos e o que fazer para uma Ecologia Integral. A síntese desse questionário está em andamento e será enviado a Roma. Foi formada uma equipe de preparação do Sínodo com 20 pessoas do América do Sul e mais um grupo de Roma. Com esse material nas mãos – as dioceses também tiveram que fazer suas consultas -, será elaborado o texto base do Sínodo em Roma.

No fundo, Francisco quer fazer da Amazônia uma referência para a Igreja Universal e também para a defesa da Casa Comum, a Terra. A impressão que ele passa é essa: o que acontecer com a Amazônia, acontecerá com o planeta Terra; o que acontecer com a Igreja da Amazônia, acontecerá com a Igreja Universal.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICASBOFF, Leonardo. Concluir a refundação ou prolongar a dependência. Petrópolis, RJ: Vozes, 2018
PALACIOS, Marco (Coordinador). Las independencias hispanoamericanas – Interpretaciones 200 años después. Bogotá: Grupo Editorial Norma, 2009.
PORTO-GONÇALVES, C. Walter. AMAZÔNIA ENCRUZILHADA CIVILIZATÓRIA – Tensões Territoriais em Curso. IPDRS / CIDES – UMSA, La Paz, Bolívia, 2018.

* Roberto Malvezzi (Gogó)
Formação: Bacharelado em Filosofia, Teologia e Estudos Sociais.
Membro da Equipe de Assessoria da REPAM-Brasil
 
http://www.agrocultures.org/o-sinodo-pan-amazonico-por-roberto-malvezzi/ 

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