segunda-feira, 25 de março de 2013

POR QUE TANTA VIOLÊNCIA NO BRASIL?

Desculpem, amigas e amigos, pela falta de atualização desse espaço. A correria da vida está em choque com o desejo de comunicação. Tentarei ser mais assíduo.

Por outro lado, não é nada agradável retornar com a notícia que segue: o Brasil é um dos países mais violentos do mundo. Mas é preciso ser realista, até mesmo para colocar uma interrogação nas leituras ufanistas, e muito mais ainda nas propagandas governamentais. Afinal, por que os assassinatos se espalham pelo país seguindo a descentralização econômica? Que tipo de "desenvolvimento" é esse que carrega consigo aumento de violência? Não seria por seu caráter de mero "crescimento econômico", sem cuidados com dimensões essenciais para que as pessoas se humanizem? Seria falta de uma cultura de convivência e de paz, ou apenas falta de aparatos de segurança?

São muitas as perguntas, difíceis as respostas. Mas precisamos refletir sobre isso, e obrigar os governos municipais, estaduais e federal a examinarem o que falta em nosso país para as pessoas se sentirem bem junto com as outras, a desejarem e trabalharem em favor de ambientes sociais seguros porque constituídos por pessoas que são e querem ser felizes. É provável que haja dois pontos essenciais nas responsabilidades públicas: 1) o deixarem de pautar sua ação governamental no cuidado da qualidade de vida das pessoas, centrando-a no atendimento dos interesses das empresas capitalistas, em nome do crescimento econômico, deixando-se, muitas vezes, corromper por elas; 2) o de não priorizarem a formação e a cobrança de valores e modos de proceder éticos das pessoas que assumem serviços públicos ligados à justiça e à segurança, bem como de todos que são servidores da população.

Em outras palavras, qual a qualidade da nossa democracia?


Os índices exorbitantes de homicídios no Brasil


Segundo dados do Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos, só em 2010 foram assassinadas 36.792 pessoas no Brasil, uma média de 100 por dia. Armas, narcotráfico e corrupção.

A reportagem é de Eric Nepomuceno, publicada no jornal Página/12, 21-03-2013. A tradução é do Cepat  publicados pelo IHU no dia 22/03/2013.

Entre 2004 e 2007, o conflito armado do Iraque resultou em 76.266 mortos. No Sudão, outro país em convulsão, os mortos foram 12.719, um pouco a mais do que os 12.417 registrados no Afeganistão. No mesmo período, os mortos da Colômbia foram 11.833. Contudo, no Brasil, entre 2004 e 2007, ocorreram 147.343 mortes por armas de fogo. Esse número é ainda mais impactante quando comparado com o total de vítimas fatais registradas em doze países que viveram conflitos armados. Da República do Congo ao Paquistão, passando pela Somália, por territórios palestinos e por Israel foram 169.574 mortos.

Esses são os dados reunidos pelo Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos, que acabam de ser divulgados em Brasília. Somente em 2010, foram assassinadas 36.792 pessoas no Brasil, uma média de cem por dia ou de quatro por hora. Uma a cada quinze minutos.

Existem outros aspectos, do mapa da violência no Brasil, que chama a atenção. Se antes as mortes violentas estavam concentradas nos dois maiores centros urbanos, São Paulo e Rio de Janeiro, agora o fenômeno se nacionalizou. Com isso, o Brasil continua ocupando um lugar de destaque entre os países mais violentos do mundo, tomando como base a proporção de assassinatos para cada cem mil habitantes: 20,4 pessoas.

Esse número coloca o Brasil em oitavo lugar entre as cem nações com estatísticas consideradas relativamente confiáveis, segundo a instituição. A média de assassinatos é o dobro daquela que a ONU considera tolerável (dez para cada cem mil habitantes). Julio Jacobo Waiselfisz, coordenador da pesquisa, destaca que a violência se disseminou por todo o país, embora tenha se concentrado no nordeste e no norte.

Em Alagoas, por exemplo, em 2010, foi registrada uma taxa de 55,3 homicídios para cada cem mil habitantes. Trata-se do estado onde mais são assassinados negros e mulheres. Na capital, Maceió, famosa por suas praias e polo de atração turística, essa média é de 94,5 para cada cem mil habitantes. Não apenas é a capital mais violenta do Brasil, mas uma das mais violentas do mundo.

O problema é que outras capitais muito turísticas, como Salvador da Bahia, também aparecem com índices elevadíssimos (59,6 assassinatos para cada cem mil habitantes). O Rio de Janeiro, oitavo estado com maior proporção de mortos por armas de fogo (26,4 para cada cem mil habitantes), tem uma capital relativamente segura, se comparada com as demais: 23,54. Mais do dobro do índice determinado pela ONU.

São Paulo, o mais rico e povoado estado do país, é um dos quatro, entre os 27 estados brasileiros, que ficam abaixo da marca que a ONU considera “tolerável”: 9,3 assassinatos para cada cem mil habitantes. Foi o estado com a mais significativa diminuição dessa proporção, no período entre 2000 e 2010, com 67,5% menos assassinatos. No Rio de Janeiro a queda foi de 43%. E no Pará, entre 2000 e 2010, o número de assassinatos cresceu o absurdo de 307%. No vizinho Maranhão, também no norte miserável, aumentou 282,2%. Na Bahia, 195%.

O estudo abrange um período que vai dos dois últimos anos do segundo mandato presidencial de Fernando Henrique Cardoso até o final dos dois mandatos de Lula da Silva. O resultado demonstra que apesar dos governos estaduais, ao longo de todos esses anos, declararem reiteradamente que a segurança pública era tema prioritário (também os governos nacionais bateram na mesma tecla), os resultados são claros e preocupantes. São políticas ineficazes ou, no melhor dos casos, insuficientes.

Há muitas explicações para o fenômeno da violência: o narcotráfico, a grande quantidade de armas (legais e, principalmente, ilegais) em circulação e a própria cultura da violência como via para solucionar conflitos pessoais.

Junto a isso é preciso somar a corrupção policial, a incompetência policial no momento de investigar os crimes, a absurda morosidade e a corrupção da Justiça, o estado degradante e degradado do sistema carcerário.

Em relação à forma como as mortes por armas de fogo se disseminaram rapidamente por todo o país, deixando de se concentrar nos dois ou três maiores centros urbanos do Brasil, a explicação é surpreendente. Segundo a pesquisa realizada pelo Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos, o fenômeno diz respeito à desconcentração industrial e migração interna provocada pela expansão geográfica de atividades econômicas. Ou seja, quanto mais a indústria e a economia se desconcentram, mais a violência segue o mesmo caminho.

A responsabilidade direta da segurança pública é dos estados, ainda que o governo nacional também tenha sua própria política sobre o assunto. De qualquer forma, os resultados observados devem ser atribuídos, principalmente, aos governos estaduais, que se mostram, na maioria das vezes, incapazes de frear a violência que cresce e se dispersa na medida em que aumenta e é disseminada a oferta de trabalho.

Isso tudo faz lembrar um velho ditado brasileiro: “Se correr, o bicho pega; se ficar, o bicho come”. São assim as coisas. O país diversifica sua economia, em todas as partes crescem as possibilidades de trabalho, emprego e renda, e também cresce a possibilidade de que, diante de uma política ineficaz de segurança pública, você seja atingido por um tiro.

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