Nota do Cimi: transmissão do coronavírus se agrava nas aldeias indígenas e demanda ações urgentes de contenção
O Cimi se solidariza e se coloca também em luto junto às inúmeras famílias que choram pela morte de seus entes queridos, impedidos de dar-lhes seu último adeus
O Conselho Indigenista Missionário – Cimi vem a público, mais uma vez, denunciar o agravamento do contágio por coronavírus no interior das aldeias indígenas em todo o Brasil, e exigir providências das autoridades frente a essa situação calamitosa, que tem vitimado inúmeros indígenas.
O
Cimi se solidariza e se coloca também em luto junto às inúmeras
famílias que choram pela morte de seus entes queridos, impedidas de
dar-lhes seu último adeus; entre esses, há muitas lideranças, em
especial as mais idosas, baluartes da história e cultura viva de seus
povos, que estão morrendo pela covid-19.
No
Brasil, nesses três meses de pandemia, os números oficiais divulgados
pela Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) indicam a ocorrência
de 103 mortes de indígenas por covid-19 e pelo menos 3.079 indígenas
contaminados até o dia 16 de junho. Já de acordo com os dados coletados
pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) até o dia 14 de
junho, os números são ainda mais assustadores: 281 indígenas mortos e
5.361 contaminados pelo novo coronavírus.
Essa
tragédia só não é maior devido às providências tomadas pelos próprios
indígenas de fechar os seus territórios logo no início da pandemia.
Mesmo assim, a contaminação se alastrou em Manaus (AM) e continua se
alastrando nas regiões do alto e médio Solimões, Vale do Javari, Rio
Negro, no estado do Amazonas, e também nos estados de Roraima, Mato
Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Maranhão, Ceará, Pernambuco, assim
como no litoral Sul do Brasil. Em todas estas regiões, o vírus já está
presente no interior das aldeias.
Diante
desse quadro de morte, dor e sofrimento dos povos indígenas,
assistimos, perplexos, às falas e posturas de ignorância e
descompromisso das autoridades do governo federal, que são manifestas de
forma desenfreada. Não bastando o discurso de ódio do presidente da
República, do ministro da Educação, o “passar a boiada” do ministro do
Meio Ambiente, ainda o presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai),
cujo dever institucional e constitucional seria o de proteger as
populações indígenas, edita a Instrução Normativa nº 09 – por meio da
qual a Funai permite o reconhecimento dos limites de imóveis privados em
terras indígenas – e agora fala na elaboração de um novo decreto de
demarcação de terras indígenas.
Seguindo
os mesmos padrões, o secretário da Sesai, em vídeo e documento, espalha
boatos, colocando povos contra povos, em relação ao Projeto de Lei nº
1142, que propõe a criação de um plano emergencial de enfrentamento à
covid-19 para povos indígenas, comunidades quilombolas e tradicionais.
Essas
posturas e ações por parte de membros do governo federal são
gravíssimas, inconstitucionais, e ocorrem em um período de extrema
gravidade do contágio do coronavírus, não contribuindo em nada para o
enfrentamento da pandemia. Pelo contrário, corroboram a discriminação, o
preconceito, a violência e o extermínio desses povos, e das demais
populações pobres no Brasil.
Infelizmente,
constatamos que hoje no Brasil existe uma postura institucionalizada de
violência contra os povos indígenas e os seus direitos, que fere os
preceitos de nossa Constituição Federal. Que essas autoridades sejam
devidamente responsabilizadas pelo não cumprimento da lei maior do país.
Exigimos
do atual governo o respeito a essa situação grave pela qual passa toda a
população brasileira, em especial os povos indígenas. Assuma as suas
responsabilidades constitucionais de cuidar e de se relacionar com a
totalidade da sociedade, e não apenas com uma parcela. É urgente um
plano de ação do governo para conter o avanço do coronavírus nos
territórios indígenas, que contemple o combate às invasões, a retirada
de invasores e a estruturação das equipes multidisciplinares com
profissionais, equipamentos e insumos para a devida assistência às
comunidades que estão clamando por socorro nas várias regiões do Brasil,
e que faça chegarem benefícios emergenciais e alimentos com segurança,
agilidade e cuidado.
Reafirmamos
a nossa contrariedade com relação a essa política de ódio,
integracionista, preconceituosa e violenta contra os povos indígenas,
concebida por um governo descompromissado com os reais interesses da
população, com a cidadania e com a soberania do Brasil.
Ao
mesmo tempo, reafirmamos o nosso apoio e compromisso com os povos
indígenas, suas comunidades, lideranças e organizações, na sua luta pela
existência e resistência nos seus territórios, sejam eles em área rural
ou urbana. Conclamamos toda a sociedade a continuar com as ações
solidárias aos pobres e às populações indígenas em todo o Brasil,
sensível ao sofrimento desses irmãos e irmãs e em contraposição ao
discurso e às ações de violência que partem de quem deveria defendê-los.
Reafirmamos também a importância da denúncia e da luta na defesa dos
direitos constitucionais dos povos indígenas, tanto no âmbito nacional e
internacional de defesa de direitos humanos.
Com
os povos indígenas, seguimos aprendendo o significado da solidariedade e
da gratuidade, redescobrindo a profunda articulação entre a vida
cotidiana e o sagrado e as incontáveis maneiras de construir em nosso
meio o Reino de Justiça, de Paz e de Liberdade.
Brasília, 17 de junho de 2020
Conselho Indigenista Missionário
Nenhum comentário:
Postar um comentário