Roberto Malvezzi (Gogó)
É cena comum um templo católico rodeado de carros aos domingos. Quem
precisa tomar um transporte público, ou não tem condição de saúde, não
estará naquela celebração dominical da Eucaristia. Eventualmente sim,
frequentemente não.
Há alguns anos fui convidado pela articulação dos Pastores Batistas do
Nordeste para conversarmos sobre a questão ecológica na Bíblia. Fiquei
hospedado na casa de família do Pastor Wellington Santos, em Maceió. Ele
tem ligação permanente com os Movimentos Sociais
e as Pastorais Sociais da Igreja Católica, particularmente a CPT. Então
ele me contou uma história bem ilustrativa.
Uma velha Senhora veio do interior de Alagoas e começou a frequentar a
comunidade Batista em Maceió, da qual ele é pastor. Um dia ela precisou
fazer uma mudança. A comunidade foi ajudá-la. Então, Wellington reparou
que havia um quarto fechado e aquela Senhora
não queria que ninguém entrasse no quarto. Cuidadosamente, ele pediu
que ela abrisse o quarto, já que ela não teria como fazer a mudança
sozinha. Meio constrangida, ela abriu a porta. O que havia ali era um
oratório típico das casas do interior do Nordeste,
com imagens de santos, um crucifixo, um rosário e outros adereços da
piedade popular católica. Então ele disse a ela: “não se preocupe, vamos
ajeitar tudo numa caixa e lá na nova casa a senhora arruma como
quiser”.
Nunca esqueci essa história por dois motivos: primeiro, a sensibilidade
do Pastor Wellington respeitando aquela Senhora. Segundo, como deve ser
confuso o mundo de tanta gente que migra, troca de comunidade religiosa,
tantas vezes porque essa é a comunidade
mais próxima, aquela que está de portas abertas e é acessível a quem
não tem recursos ou saúde para se deslocar a grandes distâncias.
Nesse mundo capitalista privatizaram as terras, as fábricas, a
biodiversidade e até o sol e os ventos para geração de energia solar e
eólica. Se tudo é propriedade privada, por que Deus não o seria?
Dessa forma, o acesso à Eucaristia há séculos é privilégio de alguns que
tem alguma Igreja próxima ou tem recursos para se deslocar e frequentar
o templo que quiser. Além do mais, muitas igrejas e seitas se julgam
proprietárias de Deus. Não que Ele se deixe
privatizar, mas a intenção de muitos é clara. Portanto, o acesso
frequente a Eucaristia em países como o Brasil, particularmente nas
grandes periferias e nas comunidades isoladas da Amazônia e do Nordeste,
é um bem privado de alguns.
Em outras palavras, um dos objetivos do Sínodo para a Amazônia com a
criação de novos ministérios como os padres comunitários, padres
indígenas, diáconas, liturgia inculturada, equipe ministeriais etc., é a
desprivatização de Deus e da Eucaristia.
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