Como a Estônia concretizou o passe livre
Tallinn, primeira capital a adotar a Tarifa
Zero, desmonta tese conservadora e registra aumento de aprovação do
serviço. Democratização do transporte público também reduziu emissões de
poluentes — e é apoiada por 90% da população
OutrasPalavras
Publicado 18/09/2019 às 18:17 - Atualizado 18/09/2019 às 19:00
Allan Alaküla, autor do texto abaixo, é um dos convidados para o seminário internacional Transporte como direito e políticas de passe livre em debate, que acontece entre os dias 16 e 18 de setembro em Niterói-RJ.
Por Allan Alaküla, no Progressive Post | Tradução: Simone Paz
Em julho de 2018, a Estônia virou o primeiro país com transporte público gratuito, onde 11 de 15 condados oferecem serviço de ônibus sem tarifa, para todos. A decisão teve como base a experiência positiva na capital, Tallinn, onde o transporte público é gratuito para seus residentes desde 2013.
Entretanto, acabar radicalmente com todas as tarifas no transporte público pode parecer, de um ponto de vista fiscal, que se tratava apenas de aumentar o subsídio de aproximadamente 80% para 100% no tráfego de ônibus rurais, e de 75% para 95% no transporte público municipal de Tallinn. De fato, nosso transporte público já contava com um subsídio que cobria bem mais do que a metade dos custos antes de se tornar “gratuito”. É o caso da maioria das redes de transporte público no continente europeu. E seria assim, certamente, se incluíssemos no cálculo não somente os custos diretos de funcionamento, mas também o investimento nas frotas de transporte público e sua infraestrutura.
O sucesso dessa ideia na em Tallinn foi assombrosa: antes da implementação, houve críticas de que o transporte gratuito discriminaria aqueles que não usam o transporte público e que a qualidade dos serviços diminuiria muito com a diminuição da capacidade, o aumento do vandalismo e de viagens “de passeio” de jovens e moradores de rua. Mas, uma vez implementada a tarifa zero, essas reclamações foram esquecidas: hoje em dia, o transporte público é reconhecido como um serviço público gratuito — comparável, de certa forma, à iluminação das ruas. De 2013 em diante, os índices de satisfação na qualidade do transporte público melhoraram em todas as categorias questionadas (pontualidade, limpeza, segurança, etc). As pesquisas atuais sobre satisfação dos usuários, no que se refere a serviços públicos, indica 90% de apoio ao transporte público grátis em Tallinn.
O modelo econômico em Tallinn baseia-se em estimular as pessoas que vivem cidade, mas têm sua residência fiscal cadastrada em outro lugar, a fazerem o registro oficial na capital, relocando, assim, seus impostos de renda ao orçamento da cidade. As estimativas oficiais indicam que o número de residentes subiu, desde 2012, de 416 mil a 453 mil pessoas. Pelas estimativas mais conservadoras, a cidade passou a ganhar, a cada ano, 30 milhões de euros a mais, graças aos impostos dos novos residentes oficiais. A perda anual de receita por não vender mais passagens de transporte público foi de 12 milhões de euros.
Tallinn não foi a criadora da ideia da tarifa zero: na verdade, aprendemos muito com os múltiplos exemplos que já existiam globalmente. Porém, após a ideia ter sido implementada, Tallinn virou, sem dúvidas, a maior cidade e a primeira capital, entre outras 100 cidades do mundo com transporte público gratuito. A experiência de Tallinn encorajou e inspirou outros a seguirem o exemplo, e, desde então, Tallinn tem sido muito ativa na rede internacional de cidades, pesquisadores e movimentos de cidadãos pelo transporte público gratuito.
No debate global, existe a afirmação de que para melhorar o transporte público, todos os outros fatores são importantes, menos o preço da passagem. Porém, uma pesquisa feita pelo Eurobarometer, em 2014, perguntava aos cidadãos quais medidas poderiam melhorar os deslocamentos nas cidades: “um transporte público com preços mais baixos” foi a resposta mais comum — dada por 59% dos europeus. “Transporte público de melhor qualidade” vinha apenas em segundo lugar, com 56%. E a acessibilidade (em termos financeiros) era a questão mais importante nos Estados-membros mais ricos: na Suécia, foi o caso de 79% dos que responderam (na Dinamarca, 75%; na Holanda, 73%; e na Alemanha, 73%).
Os objetivos do transporte público gratuito combinam simultaneamente aspectos sociais, econômicos e ambientais. Em cidades maiores, o meio ambiente deve ser a principal prioridade; porém, oferecer transporte público gratuito se refere também ao problema dos trabalhadores pobres, universalmente.
O aumento da pressão sobre pautas ambientais e o crescente abismo entre ricos e pobres devem pressionar os formuladores de políticas a considerar, globalmente, o transporte público gratuito — não apenas nas áreas urbanas, mas também no interior, que é menos povoado. Estônia e sua capital servem de exemplo mundial, como um farol, para aqueles que se interessarem em implementar a tarifa zero.
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