CARTA DO I CONVERSATÓRIO DE MULHERES
Agricultoras familiares, agroextrativistas, ribeirinhas, indígenas, pescadoras, quilombolas e trabalhadoras urbanas, nos reunimos no I CONVERSATÓRIO DE MULHERES para dialogar sobre temas relacionados aos nossos territórios e nossas vidas. Antes de tudo, reiteramos que a floresta, os rios, lagos e igarapés, os recursos madeireiros e toda a rica biodiversidade que compõem o nosso território são elementos constituintes de nossa própria existência, permeiam nossos sentidos de vida, nossas realidades e imaginários, nossa materialidade cotidiana e nossa sagrada ancestralidade.
Entretanto, nossa vida está ameaçada pela expansão de projetos desenvolvimentistas em nossa região que têm expropriado e violado nossos territórios e nossos direitos socioterritoriais. Por isso, DENUNCIAMOS a mineração por grandes empresas; a construção de complexos hidrelétricos; a financeirização da natureza; o monocultivo da soja e toda a estrutura logística para o escoamento de grãos como portos, hidrovias e ferrovias; o uso de agrotóxico na sojicultura que contamina todo o ecossistema hídrico, envenena as plantações agroecológicas de agricultoras familiares, põe em risco nossa segurança alimentar, provoca intoxicações e doenças cancerígenas na população, mata pequenas animais, e instiga conflitos em nossa convivência comunitária .
Todos esses projetos são implementados por empresas nacionais e transnacionais que pregam o falso desenvolvimento, contaminam e destroem nossos bens comuns, expulsam nossas populações de seus territórios e causam desastrosos danos aos nossos modos de vidas. São projetos que integram o sistema capitalista, caracterizado como patriarcal e racista. Por isso, os danos recaem de forma mais direta na vida das mulheres, especialmente das agricultoras familiares, agroextrativistas, ribeirinhas, indígenas, pescadoras e quilombolas, acirrando desigualdades e violências ao nosso território, ao nosso corpo e à nossa liberdade.
Mas, não estamos inertes a essas violações. Por conta disso, ANUNCIAMOS que somos mulheres de uma diversidade identitária que estamos organizadas e articuladas em associações, redes e fóruns, desde o nível local até o internacional. Nossos modos de vida são a mais genuína resistência ao avanço da ganância do capital e a prova de que um outro modelo civilizatório é possível e real: o bem viver. Um modelo que garante não somente a nossa existência, mas também contribui decisivamente para o equilíbrio ambiental do planeta, favorecendo a qualidade de vida das presentes e futuras gerações.
Assim, nossos rios são veias de vida, abastecimento hídrico e alimentar, além de espaços de lazer e entretenimento comunitário. Nossas florestas são celeiros geradores de alimentos, bem como de saúde - nossas ervas, óleos, sementes, folhas e cipós que curam nossos males do corpo e da alma. Nossos saberes populares são fontes de conhecimentos vitais para a manutenção da nossa qualidade de vida. Nossa agricultura é agroecológica - em nossos quintais produtivos manuseamos a mãe terra com carinho, cultivamos comida sem veneno, e comercializamos alimentos saudáveis nas feiras, abastecendo as mesas das famílias com comida livre de agrotóxicos. Nosso artesanato, nossas biojoias e a prática do ecoturismo comunitário também contribuem para a geração de renda das nossas famílias e dinamiza a economia local e regional.
Em suma, ANUNCIAMOS que nossos territórios são nossa pele, nosso ar, nossa vida. Portanto, não comportam cultivo de grãos de morte. Ao contrário, só cabe aqui a semeadura da RESISTÊNCIA. Por isso, reafirmamos nosso compromisso de seguir firmes na luta, convocando as mulheres do Pará, do Brasil, da Pan-Amazônia e do mundo inteiro a estabelecer uma profunda e radical aliança em prol do nosso bem viver, da liberdade do nosso corpo e dos nossos territórios.
Santarém (Pa), 25 de maio de 2018.
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