sábado, 9 de janeiro de 2016

HERODES E O MENINO

DESEJO QUE O ARTIGO DE PEDRO DE OLIVEIRA NOS AJUDE A APRENDER, COMO ELE DESTACA, O QUE OS POVOS INDÍGENAS TENTAM HÁ QUINHENTOS ANOS: A VIVER EM PAZ COM ELES - ACOLHENDO SUA CRÍTICA AO SISTEMA CAPITALISTA, QUE INSTAURA A PROPRIEDADE E O LUCRO COMO DEUSES, E QUE, POR ISSO, NEGA VALOR À VIDA, MESMO A HUMANA, NEGANDO O DEUS DA VIDA. 

Herodes e o menino
Pedro A. Ribeiro de Oliveira
Nesse dia seis de janeiro, ao celebrar com a Folia de Reis a visita dos Magos ao menino que amedrontou Herodes, me veio o gosto amargo da derrota sofrida em Imbituba, há apenas uma semana: Herodes mandou degolar mais um menino. Com o requinte de crueldade de ser a criança atacada justamente onde nos sentimos maior segurança – o colo materno.
Se Vitor fosse branco e estivesse com a família em uma praça do Rio ou São Paulo, o crime hediondo estaria em todos os noticiários e provocaria repulsa maior do que as fotos de prisioneiros prestes a serem degolados por terroristas do Estado Islâmico. Mas Vitor é Kaingang e só foi morto porque índio não tem valor para a sociedade capitalista. Não se sabe até o momento de quem é a mão que passou o estilete mortal na garganta do menino. Sabemos, porém, quem são os mandantes do assassinato: grandes proprietários e proprietárias de terra que não respeitam o direito dos Povos Indígenas a terem seu próprio modo de produção e de consumo. Tal como o Herodes bíblico, eliminam até mesmo crianças que possam um dia ameaçar seu poder econômico.
Em outros tempos a Igreja católica não ficaria em silêncio diante de um crime como esse. A nota do CIMI seria acompanhada de uma nota dos bispos e repercutiria por dezenas de milhares de comunidades de base de todo o Brasil. Celebraríamos os Reis magos, com certeza, mas não deixaríamos em silêncio o crime cometido por Herodes apenas uma semana antes. Pediríamos perdão por não termos evitado, com uma legislação e uma educação corretas, o preconceito contra os povos indígenas e nos comprometeríamos com os Santos Reis a tomar outro rumo nos caminhos da história. O sofrimento daquela pequena família Kaingang ao ver seu filho caçula esvaindo-se em sangue deveria dar um sentido mais realista à celebração da Epífania: aprender com os Santos Reis da bela tradição popular, a ver naquela criança degolada o anúncio da Libertação dos Povos Indígenas.

Que neste ano da Misericórdia, ao passar pela porta do jubileu e entrarmos numa igreja, sejamos chamados à conversão e saiamos pela mesma porta para assumir a defesa da Vida das crianças Kaingang, Kayová, Mundurucu e de todos os outros povos que há quinhentos anos querem nos ensinar a viver em Paz com eles.

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